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DIÁLOGO DO ARQUITETO E NEO EM MATRIX


“O Arquiteto - Olá, Neo.
Neo - Quem é você?
O Arquiteto - Eu sou o Arquiteto.
Eu criei a Matrix. Eu estava à sua espera. (...)”
 
Sempre reflito sobre o significado do diálogo entre Neo e o Arquiteto no “Matrix Reloaded”, busco o significado para além do próprio filme e gosto de pensar que o diálogo é uma alegoria[1] ou uma metáfora[2] que contrapõe dois tipos de agir, o racional, do arquiteto e criador da MATRIX e o passional, em Neo, aquele que busca libertar a humanidade da escravidão imposta pelo sistema
O racional, ou a racionalidade, diz respeito a ação calculada com base na eficácia dos meios escolhidos em vista de um fim, está relacionada também com a sistematização da experiência através de princípios explicativos gerais.
O termo RACIONALIDADE nasceu fora da filosofia, estava relacionado a ciências como a economia, mas Weber introduziu sua noção como conceito sociológico fundamental, descrevendo-o como uma característica de determinado tipo de agir social. Esse não é o espaço para irmos além disso, mas é necessário dizer que o conceito weberiano de racionalidade foi fundamental para Lukács e para a Escola de Frankfurt unirem-se na crítica do modo de produção capitalista, aliás segundo Lukács a identificação das características do capitalismo, na racionalidade e na calculabilidade, possibilita a análise e compreensão à profundidade do sistema, do significado e da dinâmica do modo capitalista de produção seja estudado.
Quando o arquiteto diz:
“... você continua irrevogavelmente humano. Assim sendo, algumas de minhas respostas você entenderá, e outras não. Em consonância, ainda que sua primeira pergunta possa ser a mais pertinente, você pode ou não se dar conta de que ela é também irrelevante. ”
 
Estará o criador de MATRIX, que para mim representa o capitalismo, a afirmar a irrelevância da humanidade e do indivíduo em relação ao sistema que ele criou?
Mais adiante quando o arquiteto responde à pergunta “Por que estou aqui? ” Sua resposta é devastadora:
“Sua vida é a soma do saldo de uma equação desequilibrada inerente à programação da Matrix. Você é o desenlace de uma anomalia, que, a despeito de meus mais sinceros esforços, fui incapaz de eliminar daquela, caso conseguisse, seria uma harmonia de precisão matemática. Ainda que continue a ser uma tarefa árdua diligentemente evita-la, ela não é inesperada, e portanto não está além de qualquer controle. Fato este que o trouxe, inexoravelmente, aqui. ”.
 
Noutras palavras se fosse possível descartar o ser humano MATRIX descartaria mas, paradoxalmente, o sistema que escraviza os indivíduos necessita deles e os mantém sob controle, produzindo e consumindo.
O sistema de MATRIX mantém o controle alimentando os seres humanos de algo chamado esperança, num dado momento o arquiteto afirma:
“Esperança. Eis a quintessência do delírio humano, ao mesmo tempo fonte de sua maior força e de sua maior fraqueza. ”
 
O arquiteto, sempre racional afirma ainda que:
“...99,9% de todas as cobaias aceitavam o programa, contanto que lhes fosse dada uma escolha, mesmo que só estivessem cientes dela em um nível quase inconsciente. Embora esta resposta funcionasse, ela era óbvia e fundamentalmente defeituosa, criando, assim, a anomalia sistêmica contraditória, a qual, sem vigilância, poderia ameaçar o próprio sistema. Por conseguinte, aqueles que recusavam o programa, ainda que uma minoria, se não vigiados, constituiriam uma probabilidade crescente de catástrofe. ”
 
Ao final lança Neo a uma escolha fundamental: salvar seu amor ou salvar a humanidade, o faz ao desafiá-lo:
“... momento da verdade, em que a falha fundamental é definitivamente expressa e a anomalia revela ser tanto o começo quanto o fim. Há duas portas. A à sua direita leva para a fonte e a salvação de Zion. A à sua esquerda leva para a Matrix, para ela [Trinity] e o fim de sua espécie. Como você com muita propriedade manifestou, o problema é a escolha. No entanto, nós já sabemos o que você fará, não é mesmo? Já posso ver a reação em cadeia, os precursores químicos que sinalizam o raiar da emoção, projetados especificamente para sobrepujar a lógica e a razão. Uma emoção que já o cega para a verdade simples e óbvia: ela vai morrer e não há nada que você possa fazer para impedir.”
 
O arquiteto não é humano, é a representação do sistema que criou, MATRIX. O diálogo é a meu ver entre a racionalidade característica - tão própria do modo de produção capitalista - e a passionalidade - característica da humanidade e seu desejo de construção de um modo de produção capaz de distribuir a riqueza produzida de forma mais equilibrada.
Fica a reflexão.

[1] Uma alegoria (do grego αλλος, allos, "outro", e αγορευειν, agoreuein, "falar em público") é uma figura de linguagem, mais especificamente de uso retórico, que produz a virtualização do significado, ou seja, sua expressão transmite um ou mais sentidos que o da simples compreensão ao literal.
 
[2] Metáfora: é a palavra ou expressão que produz sentidos figurados por meio de comparações implícitas. Ela pode dar um duplo sentido a frase. Com a ausência de uma conjunção comparativa.

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