Pular para o conteúdo principal

BANDIDOS ou MOCINHOS?



Não sou especialista em Direito Penal e conheço pouco o instituto da delação premiada, mas me parece que há uma enorme contradição posta, fato que me inquieta e que vou compartilhar com o leitor: os delatores são “bandidos” ou “mocinhos”? Me incomoda corruptos e corruptores serem chamados de “colaboradores”, de “delatores”, eles são o que são: réus, “bandidos” e não “mocinhos”.

O que tem ocorrido é que os corruptos ou corruptores, assaltantes da boa-fé e do dinheiro público depois de desviar recursos durante anos ao serem apanhados em flagrante através da “delação premiada” têm a oportunidade de serem tratados como colaborares ao invés de receberem o tratamento que merecem o tratamento de réus que são.

O que vejo, posso estar errado, é que pelas regras da delação os grandes corruptos e corruptores são os maiores beneficiados pelo instituto.
Penso que nenhum instituto de Direito não pode ser banalizado e a delação está sendo banalizada. A delação deve sim ser aplicada em situações de crimes graves, como é o desvio de dinheiro público.

Quando o instituto da delação foi inserido no ordenamento brasileiro, surgiram várias críticas relacionadas aos aspectos jurídico, ético e político, inclusive alegações de inconstitucionalidade no âmbito doutrinário, contudo o Supremo Tribunal Federal já considerou a delação constitucional e tem reconhecido a validade desse expediente de investigação, cuja utilização vem trazendo resultado positivo em muitos países. Não é sobre isso, portanto, que estou a escrever.

Outro aspecto que me causa enorme mal-estar é a forma que as delações são obtidas no caso da lava-jato. Antes uma introdução conceitual. A delação jamais pode ser fruto de coação física ou psíquica, nem pode representar vantagens ilegais e exageradas para o delator, não pode haver ameaças, intimidações ou constrangimentos de qualquer espécie, e se exige que, em todos os atos de negociação, confirmação e execução, o colaborador esteja acompanhado de advogado.

Ora, manter investigados, indiciados ou não, manter réus denunciados indefinidamente presos me parece tratar-se de verdadeira coação psíquica. O que tem sido noticiado é que investigados são presos e submetidos a condições muito insatisfatórias, o que pode ser considerado tortura psicológica se levarmos em conta na análise do tema o papel de setores da imprensa e transforma uma tragédia pessoal (para os presos) e institucional como espetáculo, uma espécie de reality show.


Não estou sozinho nesse ponto de vista. O jurista Celso Antônio Bandeira de Mello afirma categoricamente que há um palco montado por setores da imprensa para o juiz Sergio Moro, que conduz os processos no Paraná. O Professor Bandeira de Mello é da PUC-SP e um dos principais especialistas em direito administrativo no país, talvez ele mereça ser ouvido.

Todos nós queremos o fim da corrupção e a punição de corruptos e corruptores, mas esse fim não existirá sem o fim o financiamento empresarial das campanhas politicas, ai está a raiz de tudo, pois os interesses corporativos colidem quase sempre com o interesse público e tais interesses corporativos ou privados corrompem e induzem a degradação institucional.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

DA FAMÍLIA CORLEONE À LAVA-JATO

A autolavaggio familiare agiu e reagiu, impondo constrangimento injusto ao atacar a reputação de advogados honrados. Me refiro a Roberto Teixeira e Cristiano Zanin. Já perguntei aqui no 247 [1] : “ Serão os jovens promotores e juízes "de baixa patente" os novos tenentes" Penso que sim, pois assim como os rebeldes do inicio do século XX, os jovens promotores e juízes, passaram a fazer política e interferir nas instituições e estruturas do Estado a seu modo. Mas em alguns momentos as ações e reações deles lembram muito a obra de Mario Puzzo. As ideais dos rebeldes do início do século XX, assim como dos promotores e juízes desde inicio de século XXI, eram ao mesmo tempo conservadoras e autoritárias; os tenentes defendiam reformas políticas e sociais - necessárias naquele momento -, e no discurso estavam presentes os sempre sedutores temas do combate à corrupção e defesa da moralidade política. Deltan Dallagnol e Sérgio Moro representam os jovens promotores e juízes d...

INDEPENDÊNCIA? QUAL?

Aprendemos que no dia 7 de setembro o Brasil emancipou-se e que, por ato de bravura e nacionalismo de um príncipe português, libertou-se do jugo do colonizador. Será? Mas  somos de fato uma nação i ndependente? A nossa carta política é conhecida e respeitada por nossos lideres? Bem, de 1985 a 2013 é possível dizer que sim, mas depois da visita de Joe Biden em 2013 e das marchas de junho do mesmo ano, depois da operação Lava-Jato e do golpe de 2016 podemos dizer que vivemos em um estado de permanente risco de ruptura institucional, com militares assanhados pelo retorno de um regime autoritário. É possível fazermos um paralelo entre o IPES , o IBAD e a Operação Brother Sam , com o MBL e seus pares, a propaganda nas redes via fake news e a Operação Lava-Jato, apesar do lapso de cinquenta anos, é possível afirmar que ambas tem a origem na sanha imperialista estadunidense, inaugurada em William Mckinley. Fato é que a partir de meados dos anos 1950 (assim como em 2003), o Bras...

SOBRE PERIGOSO ESTADO MINIMO

O governo Temer trouxe de volta a pauta neoliberal, propostas e ideias derrotadas nas urnas em 2002, 2006, 2010 e 2014. Esse é o fato. Com a reintrodução da agenda neoliberal a crença cega no tal Estado Mínimo voltou a ser professada, sem qualquer constrangimento e com apoio ostensivo da mídia corporativa. Penso que a volta das certezas que envolvem Estado mínimo, num país que ao longo da História não levou aos cidadãos o mínimo de Estado, é apenas um dos retrocessos do projeto neoliberal e anti-desenvolvimentista de Temer, pois não há nada mais velho e antissocial do que o enganoso “culto da austeridade”, remédio clássico seguido no Brasil dos anos de 1990 e aplicado na Europa desde 2008 com resultados catastróficos. Para fundamentar a reflexão e a critica é necessário recuperarmos os fundamentos e princípios constitucionais que regem a Ordem Econômica, especialmente para acalmar o embate beligerante desnecessário, mas sempre presente. A qual embate me refiro? Me ref...