Pular para o conteúdo principal

"O MEDIADOR DEVE SER O CORAÇÃO!”


"Os shoppings-centers representam a ofensiva avassaladora contra os espaços públicos nas cidades, são o contraponto das praças públicas. São cápsulas espaciais condicionadas pela estética do mercado." (Emir Sader)

Aqui em casa somos todos cinéfilos. A cinefilia é o gosto pelo cinema e o interesse demonstrado por tudo àquilo que se relaciona com a sétima arte. As namoradas de meus filhos são submetidas à “prova da sala de TV”. Algumas são aprovadas, outras passam...  Bem, elas assistem “espontaneamente”, a trilogia de “O Poderoso Chefão”, “Matrix”, “Blade Runner”, “Metrópolis”, “O Clube da Luta”, “2001 - Uma Odisséia no Espaço”, “Laranja Mecânica”, “Os Incompreendidos”, dentre muitos outros, mas essa é outra história, depois eu conto...

Hoje quero falar sobre Metrópolis, que é um filme alemão de ficção científica produzido em 1927, realizado pelo cineasta austríaco Fritz Lang e que na época tratou-se da mais cara produção até então filmada na Europa (a obra que é considerada por especialistas um dos grandes expoentes do expressionismo alemão e também uma obra à frente do seu tempo, já que pode se dizer que continua bastante atual). O roteiro (baseado em romance de Thea von Harbou, esposa de Lang) foi escrito em parceria com Fritz Lang. O enredo é ambientado no século XXI, numa grande cidade governada autocraticamente por um poderoso empresário. E os seus colaboradores constituem a classe privilegiada, vivendo num jardim idílico, como Freder, único herdeiro do dirigente de Metropolis.

Os trabalhadores, ao contrário, são escravizados pelas máquinas, e condenados a viver e trabalhar em galerias no subsolo. Num meio de miséria entre os operários, uma jovem, Maria, destaca-se, exortando os trabalhadores a se organizarem para reivindicar seus direitos através de um escolhido que virá para representá-los.
Através de cenas de forte expressão visual, com o recurso a efeitos especiais, algumas se tornaram clássicas, como a panorâmica da cidade com os seus veículos voadores e passagens suspensas, há alusões bíblicas, mistério, ação e romance, num leque de informações visuais que envolvem o público e o mantém em suspense até ao final.
A obra apresenta uma preocupação crítica com a mecanização da vida industrial nos grandes centros urbanos, questionando a importância do sentimento humano, perdido no processo de desenvolvimento econômico. Como pano de fundo há a valorização da cultura, expressa no filme através da tecnologia e, principalmente, da arquitetura.
Retomo e comento a obra de Fritz Lang no contexto dos, tão comentados, “rolezinhos” e pergunto: estariam os jovens que organizam e participam dos “rolezinhos” agindo como a jovem Maria de Metropolis? Estariam esses jovens exortando os demais jovens a se organizarem e reivindicar o inalienável direito a espaços públicos de lazer e convivência?
Vivemos um tempo em que alguns juízes de São Paulo, Capital, que concederam liminares para que estabelecimentos comerciais possam escolher “quem pode ou não” entrar em suas dependências, oficializando uma política de segregação autorizando os suspeitos de rolezinho... E as liminares foram concedidas apesar da lei contra o preconceito ser clara e estabelecer penas de reclusão de até três anos para quem impedir o acesso de qualquer cliente a um local comercial. Penso que as tais liminares permitiram um retrocesso de 25 anos no País e esses senhores que as concederam serão julgados pela História.
Por que penso assim? Porque há uma grande dose de preconceito de classe nisso tudo, como retratado por Fritz Lang em Metropolis. Afinal qual o crime exatamente esses jovens comentem? A priori nenhum. Essa é a resposta honesta... Por isso andou mal o Judiciário e a saída não são liminares, não são também as bombas de gás lacrimogêneo, as bombas de efeito moral, as balas de borracha, truculência ou violação dos direitos civis usadas durante as manifestações do ano passado?  Somente quem defende um Apartheid social - que ainda impera em vários países e que existe dissimuladamente no Brasil – é que apóia a judicialização e imediata criminalização do fato.
O verdadeiro crime é a ausência de políticas sociais que incluam essa geração de jovens, que gere um leque de oportunidades, emancipação e autonomia. Esses jovens são diariamente excluídos do convívio social. Por isso afirmo: o verdadeiro crime é submeter a vida de todos nós à estética e à ética dos shoppings centers. Talvez o filme de Fritz Lang nos dê uma boa idéia do que fazer... O ponto alto do filme e grande mote é, sem dúvida, o final - onde a metáfora "O mediador entre a cabeça e as mãos deve ser o coração!" se concretiza no simbólico aperto de mão mediado por Freder entre Grot (líder dos trabalhadores) e Jon Fredersen - o empresário. 

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

A BANDA DE MUSICA DA UDN

A BANDA DE MUSICA da UDN foi apropriada por setores do PSDB, aguardemos, mas penso que não vão sequer mudar o repertório.  Para quem não lembra a  A  banda de música  da  União Democrática Nacional  foi um grupo de oradores parlamentares à época da constituição brasileira de  1946  até  64 , arrogantes, conservadores e conhecidos por fustigarem os sucessivos governos do  Partido Social Democrático  e do  Partido Trabalhista Brasileiro , ou seja, foram oposição a GETULIO, JK e JANGO. Seus nomes mais notáveis foram  Carlos Lacerda ,  Afonso Arinos de Melo Franco ,  Adauto Lúcio Cardoso ,  Olavo Bilac Pinto ,  José Bonifácio Lafayette de Andrada ,  Aliomar Baleeiro  e  Prado Kelly  .

Convalidação de atos administrativos

O Princípio da Legalidade é o princípio capital para configuração do regime jurídico administrativo, enquanto o Princípio da Supremacia do Interesse Público sobre o interesse privado é da essência de qualquer Estado, de qualquer sociedade juridicamente organizada com fins políticos. E por não ter observado esse conceito e um Decreto Municipal o jovem ex-Diretor de Cultura de Campinas Gabriel Rapassi foi sumariamente exonerado e a autorização por ele expedida para que o circo Le Cirque apresentasse seus espetáculos na “Praça Arautos da Paz” invalidada pelo Secretário de Cultura Bruno Ribeiro. Penso que a exoneração foi acertada, mas a invalidação da autorização foi um erro. Em razão disso (i) a companhia circense acabou notificada a desocupar a praça, mesmo já estando lá instalada e em vias de dar iniciam aos espetáculos, (ii) a cidade ficou sem essa possibilidade de entretenimento e (iii) o dono do Circo, provavelmente patrocinado por interesses nada republicanos ou democráticos, p

SOBRE PERIGOSO ESTADO MINIMO

O governo Temer trouxe de volta a pauta neoliberal, propostas e ideias derrotadas nas urnas em 2002, 2006, 2010 e 2014. Esse é o fato. Com a reintrodução da agenda neoliberal a crença cega no tal Estado Mínimo voltou a ser professada, sem qualquer constrangimento e com apoio ostensivo da mídia corporativa. Penso que a volta das certezas que envolvem Estado mínimo, num país que ao longo da História não levou aos cidadãos o mínimo de Estado, é apenas um dos retrocessos do projeto neoliberal e anti-desenvolvimentista de Temer, pois não há nada mais velho e antissocial do que o enganoso “culto da austeridade”, remédio clássico seguido no Brasil dos anos de 1990 e aplicado na Europa desde 2008 com resultados catastróficos. Para fundamentar a reflexão e a critica é necessário recuperarmos os fundamentos e princípios constitucionais que regem a Ordem Econômica, especialmente para acalmar o embate beligerante desnecessário, mas sempre presente. A qual embate me refiro? Me ref