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Feliz Aniversário Jacó!


Nesse outubro Jacó Bittar faz 72 anos. 


Coincidentemente assisti outro dia ao vídeo da entrevista de Jacó Bittar a Jô Soares em 1991. A entrevista aconteceu logo depois dele desfiliar-se do PT, partido que ele fundou, do qual foi o 1º Presidente (da comissão provisória) e o 1º Secretário Geral. Na entrevista Jacó mostrou sua grandeza, bom humor e espírito público elevado. Afirmou que deixou o PT para poder cumprir o papel republicano para o qual foi eleito.




Antes uma ressalva. Falar de Jacó Bittar é uma tarefa desafiadora para mim, pois convivi validamente com ele e dessa convivência nasceu uma admiração indelével, admiração e afeto que podem de alguma forma, retirar a minha capacidade de análise e critica.

O Partido dos Trabalhadores é um sonho de Jacó antes de ser um desejo do próprio Lula.

Tanto é verdade isso que em 1979 o então sindicalista Luiz Lula Inácio da Silva afirmou numa magnífica entrevista que estavam tentando criar um partido “para todos que vivem de salário, não só de operários, mas todos que trabalham”. E, citando Jacó Bittar nominalmente. A verdade dos fatos históricos pode ser inconveniente, mas há registros de que durante o ano de 1978, Lula deu inúmeras declarações contrárias à construção de um novo partido, e foram Jacó Bittar e José Maria de Almeida os homens que sustentaram a ideia da construção de um partido de trabalhadores. A ideia teria sido apresentada num congresso sindical em Lins/SP.

Dizem que, até o início de 1979, Lula manteve uma posição dúbia sobre o assunto e que ele negociava com Fernando Henrique Cardoso e Almino Affonso o fortalecimento do PMDB.


Jacó Bittar é um dos fundadores do PT. Foi presidente do partido e secretário geral nacional. Eleito prefeito de Campinas com 32,5% dos votos em 1988, mas em 1991, pediu sua desfiliação do Partido dos Trabalhadores e o PT abandonou a administração local.

Por que um dos nomes de maior importância do PT desde antes da sua fundação deixou o PT? Quais as razões? Penso que Jacó deixou o PT porque o partido não estava maduro para compreender o seu papel estratégico, assim como o dos parlamentares e o papel tático de um seu filiado à frente do Executivo. Ademais Jacó, então com 51 anos apenas, estava verdadeiramente entusiasmado com o poder de intervenção e transformação que a administração pública tem.

Jacó Bittar foi o primeiro grande nome da esquerda no Brasil que percebeu o papel tático do administrador público e a responsabilidade que pesa sobre seus ombros. Jacó não permitiu a transformação da administração municipal numa trincheira ideológica, ele dizia sempre “temos que administrar para 100% da população de Campinas e não apenas para os 32% que votaram na gente”.

Não podemos esquecer que essa posição faz todo sentido quando lembramos que na campanha de Lula à presidência da República em 1989, os adversários falavam muito no problema da falta de competência e experiência do PT. E Jacó entendia que a maior contribuição que as administrações petistas dariam à eleição de Lula, que acabou ocorrendo em 2002, seria mostrar o quão competente eram os trabalhadores na gestão da coisa pública. Jacó recebeu de Magalhães Teixeira (PSDB) uma administração com 82% de déficit público e entregou ao mesmo Magalhães um déficit de apenas 26%.

Dentre as muitas realizações daquela administração pode ser citado: o metrô de superfície ou VLT (que foi desativado pelo sucessor de Jacó); a despoluição da lagoa do Taquaral, a construção de um hospital, a municipalização da CEASA; a conclusão da ETA III e da ETA IV; o saneamento financeiro da SANASA e da EMDEC; a duplicação da estrada dos Amarais; inicio da duplicação da John Boy Dunlop, conclusão do Túnel I do completo Joá Penteado e uma das marginais do Piçarrão.

No transporte coletivo, Jacó recebeu uma frota com oito anos de idade média e entregou a frota com três anos apenas, na época a mais nova do Brasil. Foi criado um passe com desconto para a população carente e, com isso, o número de viagens aumentou em um milhão por mês. Essa questão do transporte foi uma revolução. Campinas tinha de fato a tarifa mais cara do Brasil, porém vendia o passe mais barato do país, houve a transferência do custo para o setor produtivo, pois quem pagava a tarifa plena era o empresário que comprava o vale-transporte e 12% ou 13 % dos usuários que pagavam na catraca. Foi criado o passe-passeio, que possibilitou à população de baixa renda acesso a transporte gratuito em dois finais de semana alternados por mês. E nesses finais de semana havia significativa redução da violência urbana e aumento do lazer em família.

Jacó foi ao Banco Mundial pessoalmente buscar dinheiro para dar continuidade às obras que estavam paralisadas. E tudo isso no seguinte contexto histórico: Jacó e o PT foram eleitos em 1988, ano em que “nasceu” a nova Constituição Federal, em 1989 aconteceram eleições Presidenciais, em 1990 eleições para Governador, paralelamente à elaboração da Lei Orgânica do Município, do Plano Diretor, do Plano Plurianual e uma enormidade de leis necessárias para adequar Campinas à nova constituição.

O fato é que Campinas não estava preparada para tanta criatividade na gestão. Exemplo de coragem e criatividade foi a construção em tempo recorde de casas após enchente de 1990. Em 60 dias foram construídas casas para os desabrigados, casas com água encanada, esgoto e eletricidade, mais de duzentas casas.

Jacó sempre defendeu a idéia de que o prefeito é uma peça tática do partido, que cumpre uma determinada missão e que há tarefas diferenciadas na construção partidária. Pensando assim Jacó manteve uma relação institucional de alto nível com o governado do estado e o governo federal. Porque acreditava que prefeito tem a obrigação de conversar com essas instâncias, “é uma necessidade administrativa”.

Jacó afirmava corajosamente que os prefeitos do PT foram eleitos a partir de uma expectativa partidária e não de uma orientação da direção do partido e que por isso tinham que fazer um governo tático, a fim de atender às necessidades de cada cidade. Ele dizia: “O  refeito é prefeito da cidade e não deste ou daquele partido”, por isso para Jacó era meramente institucional e republicano o seu relacionamento com governantes de outros partidos, por exemplo. Maria Luiza Fontenelle, Gilson Menezes, Jacó Bittar, Luiza Erundina, dentre outros foram vitimas da pouca experiência do PT em administrações, tanto que as tensões partido/administração não existiram apenas em Campinas, mas praticamente todos os municípios em que o PT ganhou as eleições. Aliás, isso está registrado na ata da reunião que houve entre os prefeitos petistas e a Executiva Nacional, onde Jacó propôs que o PT discutisse esse tema, o que não aconteceu na época.

O que levou Jacó a deixar o PT foi a sua responsabilidade com Campinas. Jacó, de espírito libertário, sacrificou a própria história por Campinas. Na época Jacó chegou a afirmar que precisava chamar atenção do partido para essa situação e desfiliando-se foi uma forma, pois, dizia ele “ser petista filiado é mera formalidade, serei sempre petista”.

Ele tinha plena consciência do seu papel e da necessidade de fazer um bom governo. Lembro-me quando ele participou de um programa de televisão em que disse: "Eu, como dirigente da CUT, pensaria muito antes de sentar à mesa com o governo e os empresários. Mas, como prefeito, não posso me recusar ...”. Jacó acreditava que não se pode fazer Política com revanchismo gratuito e oportunista, especialmente num partido como o PT. Evidentemente Jacó não se referia à tortura, tanto que afirmou à revista “Teoria&Debate”: “Sou contra que se esqueça o passado, a repressão, as torturas, mesmo porque fui processado pela Lei de Segurança Nacional e sei o que passei diante de um tribunal militar. Quando falo em revanchismo é do revanchismo barato.”

Feliz Aniversário Jacó!


http://www.vermelho.org.br/sp/noticia.php?id_noticia=196873&id_secao=39

Comentários

  1. Jacó Bittar foi, sem a menor dúvida, uma das pessoas mais extraordinárias que tive o privilégio em conhecer.

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