Pular para o conteúdo principal

NÃO FOI UM DOMINGO QUALQUER...

Seria um domingo qualquer, desses que se apresentam iguais a tantos outros: preguiçosos, sem aventuras ou lembranças afetivas, contudo meu filho Caio, jornalista e o melhor zagueira que já vi jogar, me convidou para assistir um jogo de futebol do seu antigo time.

 Bem, sem grandes expectativas fomos à Hípica e ao chegarmos pudemos perceber que seria um dia memorável.
Seus amigos Thiago Albernaz, o Tiba, e Rodrigo Curti, o Digão, dentre outros, conseguiram reunir quase todos os meninos que viveram aventuras esportivas nos diversos campeonatos ou copas em Campinas, na região e até na Europa, isso dos cinco ou seis anos de idade até os dezessete ou dezoito anos...

Além dos meninos (hoje adultos, profissionais, alguns maridos ou pais...), que alegraram tanto nossos finais de semana com seus sonhos, revelados em sorrisos e abraços generosos, estavam lá alguns pais, mães, irmãos e professores.

Não havia quem não estivesse muito emocionado e sensível a lembranças que alimentam e dão sentido à alma e à vida.
Dito isso gostaria de falar de uma virtude fundamental: a amizade.

Aristóteles nos lega a lição de que a amizade é essencial, em dois livros sublimes da “Ética a Nicômaco”. Na obra ele nos convida a procurar o bem e indagar o que ele é. Afirma que se existe uma finalidade para tudo o que fazemos, a finalidade deve ser o bem. A melhor função do homem é a vida ativa que tem um princípio racional. Devemos compreender o bem como atividade da alma e o resultado é a felicidade. É na amizade que encontramos o caminho do bem e da felicidade.

Sem o exercício da amizade a vida seria um erro e um grande vazio, seria com a polidez: necessária, um pré-requisito, mas um nada em si. A amizade é condição da felicidade, refúgio contra a infelicidade, ao mesmo tempo útil, agradável e boa.

A amizade, segundo Aristóteles, é “desejável por ela mesma” e “consiste antes em amar que em ser amado”. A amizade seria uma espécie de igualdade, que a precede ou que ela instaura. Valeria mais que a justiça, e a inclui, que é ao mesmo tempo sua mais elevada expressão e sua superação.

Amizade seria comunidade, partilha, fidelidade, afinal os amigos se rejubilam uns aos outros, e com sua amizade em si, sem qualquer razão outra que não ela própria.

É verdade que não se pode ser amigo de todos, nem da maioria, mas os amigos nos emprestam um sentido de completude, de inafastável importância, amizade é uma virtude, um presente, uma forma de amar.

Mas quem são nossos amigos?

Bem, falando sobre o sentido profundo da amizade, o Papa Francisco afirmou recentemente que nunca teve tantos “amigos” como agora, todos querem ser amigos do Papa... Mas a amizade é algo muito sagrado, um amigo não é um conhecido, com quem se tem uma conversa, um amigo é um irmão que tudo compreende, repreende, perdoa e, de mãos dadas, ajuda na reparação que segue-se ao arrependimento; um amigo é um irmão que presenteia com um abraço discreto, quase invisível, nas nossas vitórias e nos acolhe às escancaras nos nossos tropeços. Francisco nos adverte ainda para o sentido utilitário das amizades, de aproximar-se de uma pessoa para tirar proveito. Isso, segundo ele, machuca a alma; usar as pessoas ou ser usado por elas é dolorido. O que nos vale é amizade resiliente, já a amizade interesseira (experiência pela qual todos passamos) é caminho de aprendizado. A amizade é um acompanhar a vida do outro a partir de um pressuposto tácito, qual seja: de que as verdadeiras amizades nascem espontaneamente e perduram, não obstante o tempo.
Nesse tempo em que impera a cultura da inimizade, contra a qual é preciso trabalhar e substituir por uma cultura de paz.
Já a Professora Luciana Karine de Souza, doutora em Psicologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, pesquisadora no Departamento de Psicologia da Universidade Federal de Minas Gerais argumenta no seu “Educação para a paz e educação moral na prevenção à violência[1] que a promoção da maturidade de julgamento moral por meio de debates de dilemas morais favorece o surgimento do raciocínio crítico que possibilita o questionamento de situações injustas, inclusive no que tange à violência, seja ela direta ou estrutural e indica a utilização de dilemas morais com conteúdo relacionado à busca da paz em diferentes níveis, como o escolar, o social e o internacional, considera ainda que na compreensão dos fenômenos de paz e de violência estão implícitas as normas, valores e experiências compartilhadas por uma dada cultura, o questionamento dessas normas e valores pode levar a mudanças na compreensão desses fenômenos. É um ensaio fundamental, mas talvez tenha faltado dizer que a educação para a paz pode ter início com um abraço, uma gargalhada ou no silêncio fundamental de um amigo que nos ouve, não julga e tanta paz empresta a essa nossa breve aventura.

Obrigado à sorte, força divina reguladora dos acasos, e aos amigos Tiba, Digão, Ticelli, aos irmãos Raul e Renê, Braga, Caetano, Mineiro, Gerba, Zini, Mauricio, Murilinho, Lê, Déco, Caiosa, Professor André e aos pais e mães, por terem transformado um domingo qualquer em lembrança afetiva e perene, obrigado pelo abraço, pela gargalhada e por ouvirem em silêncio generoso tudo quanto foi ou será dito.







[1] http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-69752007000200008

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

SOBRE PERIGOSO ESTADO MINIMO

O governo Temer trouxe de volta a pauta neoliberal, propostas e ideias derrotadas nas urnas em 2002, 2006, 2010 e 2014. Esse é o fato. Com a reintrodução da agenda neoliberal a crença cega no tal Estado Mínimo voltou a ser professada, sem qualquer constrangimento e com apoio ostensivo da mídia corporativa. Penso que a volta das certezas que envolvem Estado mínimo, num país que ao longo da História não levou aos cidadãos o mínimo de Estado, é apenas um dos retrocessos do projeto neoliberal e anti-desenvolvimentista de Temer, pois não há nada mais velho e antissocial do que o enganoso “culto da austeridade”, remédio clássico seguido no Brasil dos anos de 1990 e aplicado na Europa desde 2008 com resultados catastróficos. Para fundamentar a reflexão e a critica é necessário recuperarmos os fundamentos e princípios constitucionais que regem a Ordem Econômica, especialmente para acalmar o embate beligerante desnecessário, mas sempre presente. A qual embate me refiro? Me ref...

DA FAMÍLIA CORLEONE À LAVA-JATO

A autolavaggio familiare agiu e reagiu, impondo constrangimento injusto ao atacar a reputação de advogados honrados. Me refiro a Roberto Teixeira e Cristiano Zanin. Já perguntei aqui no 247 [1] : “ Serão os jovens promotores e juízes "de baixa patente" os novos tenentes" Penso que sim, pois assim como os rebeldes do inicio do século XX, os jovens promotores e juízes, passaram a fazer política e interferir nas instituições e estruturas do Estado a seu modo. Mas em alguns momentos as ações e reações deles lembram muito a obra de Mario Puzzo. As ideais dos rebeldes do início do século XX, assim como dos promotores e juízes desde inicio de século XXI, eram ao mesmo tempo conservadoras e autoritárias; os tenentes defendiam reformas políticas e sociais - necessárias naquele momento -, e no discurso estavam presentes os sempre sedutores temas do combate à corrupção e defesa da moralidade política. Deltan Dallagnol e Sérgio Moro representam os jovens promotores e juízes d...

PALOCCI, UM GRANDE FILHO DA PUTA.

Todos que jogam ou jogaram futebol, bem como aqueles apaixonados que frequentam as arquibancadas para torcer pelo seu time do coração ouvem e, por certo, já proferiram a libertadora expressão “ filho da puta ” ou, com mais esmero, “ filho de uma puta ”, dentre outros palavrões de caráter igualmente libertador. E todos sabem que tal expressão tem semântica própria, pois ninguém que refere à mãe daquele a quem direcionamos qualquer dos necessários palavrões. O adequado uso de palavrões representa síntese e expressa indignação diante de um erro inescusável do Juiz ou de um dos jogadores de qualquer dos times, há, portanto, uma dialética nos palavrões e isso merece atenção. Ou seja, é há uma dialética do palavrão. Na literatura também encontramos o uso de palavrões. Entre os escritores mais lidos da literatura brasileira, o romancista baiano Jorge Amado (1912-2001) é um dos que mais usa o palavrão em sua vasta obra literária. E falando em romances, Amado não é o único int...