INTRODUÇÃO.
O Golpe de Estado
de 2016 teve inicio com a judicialização
da política e se completou com a declaração de que vivemos em Estado de Exceção.
Bem, a nossa
república é fruto de um golpe militar; golpe patrocinado por uma elite agrária
vingativa e ressentida.
O tal Marechal
Deodoro, que dizem era um monarquista, se prestou ao papel de protagonista de
um golpe militar que expulsou do país o imperador “do dia para a noite”.
O golpe ocorreu
porque a elite não foi indenizada pela coroa em razão da abolição da
escravatura. Isso mesmo, a elite reivindicava do Estado indenizações
proporcionais ao preço total que haviam pago pelos escravos que foram
libertados por lei; as tais indenizações seriam pagas com empréstimo externo,
um absurdo ao qual o império não se rendeu.
O fim da escravidão
era questão que se impunha como necessária, mas que encontrava viva resistência
entre as elites agrárias tradicionais do país.
A conseqüência da
não indenização da elite foi que ela aderiu à causa republicana; o fez não por
causa de um sentimento ou ideal republicano, mas como uma verdadeira
"vingança" contra a monarquia, mais ou menos a mesma motivação de
Eduardo Cunha ao receber e dar seguimento ao pedido de impeachment contra
Dilma.
Mas como de valores
democráticos e republicanos não nasceu essa nossa republica ocorreram outros
golpes, sobre o que escrevi aqui nos 247[1].
Deodoro, o
presidente monarquista, dissolveu congresso em 3 de novembro de 1891 e
instaurou um estado de sitio; tudo muito legal, afinal ele assinou decretos...
Suspendeu a constituição e direitos individuais e políticos; o exercito cercou
o Senado e garantiu ampla e “espontânea” adesão ao golpe... Os “subversivos”
foram presos como de praxe.
E de triste memória
o Golpe civil-militar de 1964, que representa uma das páginas mais tristes da
nossa História republicana, foi apoiado pelos avós ou pais de diversos dos
personagens que operaram o golpe contra Dilma Rousseff e contra a democracia e,
assim como o golpe de 3 de novembro de 1891, está “tudo legalizado” por um STF
politizado, partidarizado e acovardado, um STF envolvido num véu que engana os
contemporâneos, mas não iludirá a História.
Gosto de registrar
que o golpe de 64 nasceu em 1950 com a vitória indesejada de Getúlio Vargas -
indesejada pela elite de então - e só não aconteceu em 1954 porque Vargas
suicidou-se e, transformado em mártir, adiou a sanha de poder daqueles que não
tinham e não tem voto.
OS GOLPES DO SÉCULO XXI.
Cito novamente o
grande Ricardo Lodi Ribeiro, que com sua costumeira inteligência, deu luz ao
fato de os golpes no século XXI não utilizarem mais de tanques e baionetas, mas
a manipulação de argumentos jurídicos e políticos que usurpam o papel da
soberania popular na escolha dos governantes, com diligente concurso de uma
imprensa vergonhosa, imprensa que, segundo Millôr Fernandes, é a verdadeira
oposição, o resto seria armazém de secos & molhados.
Eu não imaginei que
viveria um Golpe de Estado, por isso peço desculpas aos meus filhos e aos netos
que ainda não tenho por não ter participado mais efetivamente do processo político
do Brasil, por não ter sido capaz de impedi-lo, por ser nada além de um mero
expectador impotente diante disso tudo.
A JUDICIALIZAÇÃO, SEMENTE DO GOLPE.
O
golpe de Estado que vivemos é a usurpação ilegítima do poder e ao contrário das
revoluções, sobre o que podemos escrever noutro momento, tem um caráter
pessoal, egoístico.
Ele busca a tomada do poder para atender o interesse de uma pessoa ou de um pequeno grupo que representa interesses que são contrários ou não são contemplados pelo establishment Político.
Ele busca a tomada do poder para atender o interesse de uma pessoa ou de um pequeno grupo que representa interesses que são contrários ou não são contemplados pelo establishment Político.
No
Brasil ele ocorreu porque os derrotados, descontentes e golpistas, incapazes de
alcançar o poder pelo voto popular, buscaram através de manobras políticas, com
indispensável concurso da mídia e de parcela do Poder Judiciário, assumir a
posição de Chefe de Governo e o fizeram de uma forma ardilosa: legalizaram e legitimaram a ruptura
institucional instrumentalizando o Poder Legislativo e do Judiciário, sempre
com concurso da mesma imprensa que apoiou o golpe de 1964, ou dela nasceu. A
meu juízo, o golpe de estado no Brasil foi completado com sucesso.
Há inúmeros fatos
para exemplificar a minha convicção, fatos que representam verdadeira esculhambação aos valores republicanos. Por favor, não me censurem
pelo uso do substantivo feminino “esculhambação”[2],
pois ele representa precisamente o que a elite servil aos interesses
internacionais e o Judiciário estúpido fez e ainda está fazendo.
E
essa esculhambação dos valores republicanos ocorreu no padrão contemporâneo de
fazer política (assim mesmo, com “pê” minúsculo): usando a mídia para dar
contornos de fato positivo ou negativo conforme a conveniência.
Mas
o verniz civilizado e civilizatório rompe-se com facilidade em nossa sociedade
quando interesses são contrariados, basta observarmos o que está acontecendo
hoje no país, onde o moralismo publicado [esconde] interesses impublicáveis.
1964
foi um golpe de Estado, pois foi um grupo que havia perdido as eleições
presidenciais para Getúlio Vargas, para Juscelino Kubitschek e para Jânio
Quadros; esse grupo ao lado dos maus militares, tomou para si o poder e tentaram
rebatizar o evento nefasto de “revolução” e dar a ele contornos de legalidade e
legitimidade controlando o Congresso e o Judiciário, mas o tempo e a História
deram conta de sepultar a versão.
O
golpe de Estado é comum em locais cujas instituições políticas são fracas, onde
não existe a certeza do cumprimento de todas as normas constitucionais no que
diz respeito à sucessão dos cargos políticos ou à garantia dos direitos
individuais. No Brasil as instituições estão apropriadas de uma aristocracia urbana,
carreirista e sem nenhum compromisso com o país.
O
golpe de Estado foi muito comum na América Latina, África e Oriente Médio no
decorrer do século XX e seus principais agentes e protagonistas apareciam quase
sempre como os novos salvadores da pátria, haja vista sempre acontecer algum
distúrbio ou crise quando de um golpe de Estado.
Fato
é que vivemos tempos sombrios, um tempo em que os golpistas lançaram mão da
bandeira do combate à corrupção, como fizeram em 1954 e em 1964, mas,
paradoxalmente, defendem a redução da maioridade penal, o impeachment, a
ruptura institucional, a venda do patrimônio nacional e a “abertura dos portos
às nações amigas”...
O MÉTODO DO GOLPE E O ESTADO DE EXCEÇÃO.
Tenho
escrito faz algum tempo que tudo isso faz parte de um encadeamento de atos e fatos
os quais, na minha maneira de ver, são os responsáveis à inflexão conservadora,
sombria mesmo, que estamos testemunhando no país.
Trata-se
da construção do golpe.
O
golpe em curso instrumentalizou uma metodologia sofisticada:
(a) a Judicialização da Política;
(b) a Politização
do Poder Judiciário;
(c) a
espetacularização (midiatização) do que foi judicializado;
(d) a
criminalização da Política, dos políticos e dos partidos políticos, de forma
seletiva;
(e) declaração de que o país vive em
Estado de Exceção;
Eu realmente me
surpreendi com o surgimento de um item “e”
desse sofisticado método usado para construção do golpe...
Eu não imaginei que
o Poder Judiciário declararia que vivemos um Estado de Exceção.
DO ESTADO DE EXCEÇÃO.
O
Poder Judiciário deveria ser o guardião da lei e da constituição, deveria ser o
garantidor dos direitos e garantias fundamentais, prestou-se a declarar que
vivemos em Estado de Exceção, o fez para que o Golpe de Estado de 2016 seja
concluído sem os entraves que a lei e a constituição poderiam criar.
O
Tribunal Regional Federal da 4ª Região conferiu ao Juízo da 13ª Vara Federal de
Curitiba verdadeira “carta branca” para desrespeitar a lei e a constituição, tudo
com base na “Teoria do Estado de Exceção”.
Isso
mesmo, o TRF 4 na decisão do P.A. CORTE ESPECIAL Nº 000302132.2016.4.04.8000/RS,
relatado pelo Desembargador Federal Rômulo Pizzolatti que decidiu, por maioria,
que a operação "lava jato" não precisa seguir as regras processuais comuns,
por enfrentar fatos novos ao Direito, mais ou menos o que Deodoro fez em 1891 e
o que os militares faziam através dos Atos Institucionais.
Bem,
o TRF 4 fundamentou essa temerária decisão na “Teoria do Estado de Exceção”, o
que é, data máxima vênia, um crime contra a nação. E o STF queda silente.
Para
compreender a tal teoria é necessário olhar o que aconteceu na Alemanha após a
1ª Grande Guerra.
Vamos
lá.
Terminada
a Primeira Guerra Mundial, em um contexto marcado pela desordem interna e por
significativa fragmentação política, submetida às restrições do Tratado de
Versalhes e perante a ascensão do comunismo, a Alemanha redigiu sua
Constituição.
Estamos
falando da Constituição de Weimar, muito criticada, principalmente porque
apesar de traçar a estrutura básica do Estado, em consonância com as
constituições erigidas sob a tradição liberal, adotava em sua segunda parte um
rol de direitos fundamentais
individuais e sócio-econômicos
que se identificariam com as pretensões da esquerda social-democrata
e comunista.
A
Constituição de Weimar colocou fim ao Segundo Reich, mas não ao legado
autoritário e militar do Império.
Bem,
a alegada fragmentação ou contradição ideológica da Constituição de Weimar
estava na base da argumentação de seus críticos.
Para
Carl Schmitt, àquele tempo principal opositor da Constituição de Weimar,
naquela constituição havia numerosos dispositivos que não representavam genuína
decisão política da Alemanha pós-guerra e, por conseguinte, prejudicavam a
construção de uma comunidade nacional homogênea.
Resultaria dessa antinomia entre a lei e a vontade
ou decisão política nacional o conceito de exceção, que passaria
legitimamente a ocupar o núcleo da vida política. Noutras palavras diante da
existência de antinomia de impossível harmonização aplicar-se-ia a “Teoria do
Estado de Exceção”.
Essa
é, sob censura, a minha compreensão sobre a “Teoria do Estado de Exceção”.
O
Brasil tem uma constituição, a qual em breve completará trinta anos.
Trata-se
de uma constituição de inspiração social-liberal, não há por aqui sistemas
jurídicos antinômicos, não estamos vivendo desordem interna ou significativa
fragmentação política.
Por isso a “carta
branca” concedida ao Juízo da 13ª Vara Federal de Curitiba não se justifica,
repito, é um crime de lesa-pátria e deve ser revogada pelo Supremo Tribunal
Federal e providências tomadas, pois em não sendo assim estará decretado o fim
do Estado Social e Democrático de Direito.
CONCLUSÃO.
A
sociedade tem de compreender que o golpe foi “um sucesso” e precisa reagir,
pois estamos no século XXI, nossas instituições deveriam ser fortes e uma
ruptura institucional é trágica para a nação.
Se nada ocorrer a sanha privatista seguirá destruindo
as grandes empresas nacionais, derretendo empregos, avançará transferindo ao
capital internacional todas as nossas riquezas, além de criminalizar a esquerda
e colocar na prisão seu maior líder.
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