"... a Lava Jato é disparado o maior
problema" das demissões.
[Porque] 70% do setor tem contrato com a Petrobras.
Na prática, estamos vivendo uma crise institucional
e da engenharia nacional, sem perspectiva a médio
prazo".
Vilmar Santos –
Presidente da Federação Nacional dos Trabalhadores
nas Indústrias da Construção Pesada
Sobre a intervenção do Estado na Economia e nas
relações sociais.
O Papa João XXIII, na Encíclica Mater
et Magistra (1961), pregou a necessidade de interferência do Estado
nas relações sociais e econômicas, para a garantia do bem comum, ele foi o
verdadeiro Papa Pop.
João XXIII asseverou que o Estado não pode
manter-se afastado do mundo econômico, já que a razão de ser deste é a
realização do bem comum. Nesse sentido deve o Estado, portanto: “(...) intervir com o fim de promover a produção
duma abundância suficiente de bens materiais, cujo uso é necessário para o
exercício da virtude, e também para proteger os direitos de todos os cidadãos,
sobretudo dos mais fracos, como são os operários, as mulheres e as crianças. (...)
Mas é preciso insistir sempre no princípio de que a presença do Estado no campo
econômico, por mais ampla e penetrante que seja, não pode ter como meta reduzir
cada vez mais a esfera da liberdade na iniciativa pessoal dos cidadãos; mas
deve, pelo contrário, garantir a essa esfera a maior amplidão possível,
protegendo, efetivamente, em favor de todos e cada um, os direitos essenciais
da pessoa humana”[1].
Chegou a hora do Estado intervir nas
empreiteiras que formaram cartéis, corromperam agentes públicos, agindo de
forma patrimonialista traíram a confiança do mercado e abusaram do Princípio da Livre Iniciativa e burlaram
o da Livre Concorrência.
Isso
mesmo, estou propondo uma intervenção, de caráter temporário, para um necessário
acertamento das coisas.
E a Constituição Federal no artigo 170
autoriza essa ideia, pois orienta e resguarda a livre concorrência[2],
mas essa livre concorrência e a livre iniciativa são é Direitos que
devem estar ao lado em equilíbrio a outro princípio, o da valorização do trabalho humano, sempre com vistas a assegurar a
existência digna, conforme os ditames da justiça social.
É claro que a livre concorrência deve estar alicerçada nos preceitos trazidos
pelo texto constitucional. Sobre a livre
concorrência sabemos que ela é considerada como a existência de diversos
produtores ou prestadores de serviço. A livre
concorrência, portanto, consiste na situação em que se encontram os
diversos agentes produtores de estarem dispostos à concorrência de seus rivais.
Livre concorrência é a abertura
jurídica concedida aos particulares para competirem entre si, em segmento
lícito, objetivando o êxito econômico pelas leis de mercado.
Está evidente que as empreiteiras envolvidas
na Lava Jato e no escândalo do METRO Paulista não zelaram pela livre
concorrência.
Por que?
Ora, formaram cartéis, por exemplo, lesando os interesses público e o consumidor (outro princípio resguardado
pelo Art. 170), que acaba por não ter opções e se vê obrigado a consumir
determinado bem ou serviço de determinada empresa, que acaba, ou figurando
sozinho no mercado, ou o dominando. Isso resulta em uma condição indigna, pois
não permite ao indivíduo obter total acesso a todos os bens de consumo (por
força de elevados preços praticados ou, ainda, em face da má qualidade dos
produtos).
Razões econômicas.
Depois de
deflagrada a Operação Lava Jato (que
investiga escândalo de corrupção envolvendo Petrobras, políticos e empreiteiras)
o setor da construção civil registrou um saldo negativo de 250 mil empregos formais
de outubro de 2014 a fevereiro de 2015. Os dados são oficiais, do Caged - cadastro
de empregados com carteira assinada, do Ministério do Trabalho. A redução dos
empregos formais é um efeito colateral, indesejado e talvez inesperado, da
necessária operação Lava Jato.
Centrais
sindicais, federações de trabalhadores e o ministro do Trabalho e Emprego também
pensam dessa forma (já na visão de
empresários a queda dos empregos formais se deve à falta de investimentos e atraso
de pagamentos do governo, para o mercado sempre é culpa do governo...). O fato
é que de acordo com o Caged, o estoque de empregos com carteira assinada na
construção foi reduzido em 10% nos últimos meses, o maior índice entre todos os
setores destacados e isso é alarmante, pois sabemos que a Petrobras tem contrato com 70% do setor da
construção civil e por essa razão algo tem de ser feito, o emprego e a
economia não podem ficar à mercê da dinâmica dos tempos do Poder Judiciário,
especialmente não pode ficar à mercê dos tempos do Juiz Moro, o qual parece
caber no figurino citado por José Renato Nalini: "Se é verdade que o poder corrompe e o poder absoluto
corrompe absolutamente, não é menos verdadeiro que os holofotes dão destaque,
mas também corroem a imagem.".
Por que afirmo que algo deve ser feito? Porque se por um lado é
necessária, e até fundamental, que a Lava Jato apure com diligencia e
honestidade o que lhe cabe, por outro lado o Poder Judiciário não pode ser
instrumento, voluntário ou não, de agravamento da crise econômica.
Vemos que na esteira da investigação, empresas quebram e
demitem, e isso tende a piorar. Some-se a isso tudo a inegável redução da atividade econômica percebida desde
2013, a qual diminuiu a arrecadação dos estados e os novos governadores
anunciaram cortes de 13 bilhões de reais neste ano, dispensas de funcionários
estariam incluídas. A desaceleração tende a se agravar com o novo aperto
no crédito do BNDES, a redução dos estímulos à exportação e a revisão da
desoneração da folha de pagamento realizado pelo governo. As projeções de crescimento
do PIB passaram de um crescimento pífio para zero ou negativo.
E esse ambiente complicado na economia tem sido
agravado pelos desdobramentos das investigações da Lava Jato. Ao atingir as
maiores empreiteiras do País, a operação provocou um efeito dominó de paralisia
das grandes obras Brasil afora. A mais recente vítima foi a construção do
Rodoanel, em São Paulo. As empreiteiras se preparam para diminuir de tamanho,
talvez recuar para as dimensões de dez ou 15 anos atrás, e já colocaram vários
ativos à venda. Os financiamentos minguaram, pois nenhum banco quer se
comprometer com empresas sob investigação.
Em janeiro, a Sete Brasil pediu autorização do governo para
arrendar sondas e plataformas no mercado internacional e substituir as
empreiteiras envolvidas na Lava Jato. “Punir responsáveis com culpa provada
está certo, mas há empresas brasileiras de notável capacidade técnica
demitindo. Isso terá uma repercussão social enorme”, avalia o presidente do
Clube de Engenharia do Brasil, Francis Bogossian.
Então o que fazer? Intervir em caráter temporário nas
companhias, esse é o caminho.
Exemplo dos
EUA.
Não venham os críticos de plantão dizer que isso é coisa de
comunista, pois o governo americano, entre 2008 e 2009, estatizou empresas de
hipoteca, seguradoras, a GM, vários bancos, etc., com objetivo de proteger o
mercado, os interesses dos investidores, fato que acabou, em certa medida,
mantendo empregos em tempos de colapso sistêmico. Esse é o caminho a seguir,
pois a defesa da concorrência eficaz sempre foi sinônimo de intervenção
econômica, por meio da restrição e mesmo do desfazimento de monopólios, proibir
e punir cartéis, restrições verticais etc. Afirmar que defesa da concorrência
não pode ser interventiva é uma contradição em termos.
Lembremos o que aconteceu. O
presidente Obama desembolsou mais 30 bilhões de dólares e ficou com 60% das
ações comandou o funeral dessa história e deixou claro que o tal mercado e sua mão invisível são presentes e eficientes apenas em períodos de
prosperidade, em momentos de crise a omissão do mercado denuncia seu caráter e
sua natureza bárbara. Registremos que o governo americano, que antes da
aquisição das ações, já colocara 20 bilhões de dólares para tentar salvar a
empresa. O que ocorreu, sejamos honestos, foi a estatização temporária da
companhia. A ideia era a empresa ser reformulada e depois o tesouro americano
vender as ações no mercado, o que deve ter ocorrido, mas não podemos deixar de
registrar que a intervenção estatal, mesmo
temporária, produziu uma ironia incontornável: o país-símbolo do
capitalismo estatizou a empresa-ícone do capitalismo, mas talvez esse seja um caminho a seguirmos no
Brasil para manter-se os empregos e as obras de infraestrutura em curso.
Se bilhões do Tesouro americano puderam ser destinados a
salvar suas companhias e o mercado[3],
por que não podemos pensar aqui no Brasil numa estatização temporária das
empreiteiras com objetivo de recuperar e depois manter o nível de emprego e o
desenvolvimento das obras de infraestrutura pelo país? Podemos, afinal o art.
170 da CF, assegura e reconhece a propriedade privada e a livre empresa, mas condicionam
o uso destas ao bem estar social e os dirigentes e controladores dessas
empreiteiras são os grandes causadores de todo o caos em curso pois, repito:
traíram a confiança do mercado, do Estado e dos princípios do liberalismo que
eles deveriam guardar, colocada “a casa em ordem” devolve-se o controle ao
setor privado, resguardando o direito do Estado, da Petrobrás e do METRO
Paulista serem indenizados pelos danos causados pelas ações de seus dirigentes.
[1]
PAPA João XXIII. Rerum
Novarum, apud VENANCIO FILHO, Alberto. A intervenção do Estado no domínio econômico:
O Direito público econômico no Brasil. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas,
1968, p. 18.
[2]
Livre
concorrência é, primeiramente, um preceito; um fundamento do Liberalismo, em
face da liberdade do próprio mercado, que pode em tese, concorrer livremente,
utilizando-se de recursos para a obtenção de maiores resultados econômicos.
[3] Mesma lógica que presidiu os pacotes de 1,45
trilhão de dólares baixados pelos governos Bush e Obama com o propósito de
resgatar o sistema financeiro, centenas de bilhões de dólares foram canalizados para os
mesmos bancos que desalojavam e condenavam ao olho da rua milhões de trabalhadores e trabalhadoras que perderam
seus empregos com a crise, através das ociosas execuções hipotecárias.
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