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INDIGNAÇÃO SELETIVA E ESPETÁCULOS MIDIÁTICOS


Recebo todas as denúncias, acusações e suspeitas de corrupção que envolvem o Partido dos Trabalhadores com muita tristeza, pois fui militante do PT de 1980 a 1991, retornei ao PT em 2002 e fiquei por lá até 2005. O PT seria o partido a realizar os sonhos generosos da minha adolescência e juventude, sonhos de justiça social, distribuição de renda, produção e distribuição de riqueza com respeito ao meio ambiente, etc. Penso que ao chegar à presidência da república o PT cumpriu parcialmente essa missão.

Sou, por princípio, a favor da apuração de quaisquer denúncias, acusações e suspeitas, bem como de se processar os suspeitos e da condenação firme dos culpados. É assim que deve ser. E sou também contrário à transformação de denúncias e investigações e espetáculos midiáticos.

Tenho escrito faz alguns anos que as relações entre o sistema judicial e o sistema político atravessam um momento de tensão sem precedentes, cuja natureza se pode resumir numa frase: a judicialização da política conduz à politização da justiça. A opinião não é só minha. Há judicialização da política sempre que os tribunais, no desempenho normal das suas funções, afetam de modo significativo as condições da ação política, ou interferem em questões que originariamente deveriam ser resolvidas na arena política e não nos tribunais. A Judicialização é uma tática e a politização do judiciário um efeito colateral.

E o objetivo dessa tática (transferir tudo para o Judiciário e usando a imprensa para repercutir o fato, mesmo que não provado) é buscar, por meio da exposição nos órgãos de imprensa dos adversários (qualquer que seja o desenlace) para enfraquece-lo ou mesmo o liquida-lo, politicamente. Essa tática é questionável sob o ponto de vista ético e democrático, mas é o que acontece.

No momento em que isso ocorre (Judicialização e espetacularização) ao mesmo tempo surgem convulsões sérias no sistema político e isso porque setores renunciam ao debate democrático e a transformam a luta política em luta judicial e em espetáculo midiático, um verdadeiro Reality show.

Ademais, a politização da justiça (ou do Poder Judiciário) coloca o sistema judicial numa situação de estresse institucional que, dependendo da forma como o gerir, tanto pode revelar dramaticamente a sua fraqueza, como a sua força.

A midiatização de investigações e das operações da Polícia e do Ministério Público, por exemplo, buscam transformar a plácida obscuridade dos processos judiciais na trepidante ribalta mediática dos dramas humanos. E essa transformação é problemática devido às diferenças entre a lógica da ação midiática, dominada por tempos instantâneos, e a lógica da ação judicial, dominada por tempos processuais lentos, da segurança necessária, do direito de defesa e do processo legal.

É certo que tanto a ação judicial e as investigações, quanto a ação midiática partilham o gosto pelas dicotomias drásticas entre ganhadores e perdedores. Mas, enquanto os primeiros exigem procedimentos de contraditório e provas convincentes, a segunda dispensa tais exigências. Em face disso, quando o conflito entre o judicial e o político ocorre na mídia, que está longe de abranger veículos neutros, é um fator autônomo de retroalimentação do conflito.

Não há neutralidade na mídia.

E, sendo assim, as iniciativas tomadas para atenuar ou regular o conflito entre o judicial e o político não terão qualquer eficácia se os meios de comunicação social não forem incluídos no pacto institucional. É preocupante que tal fato passe despercebido e que, com isso, se trivialize a lei da selva midiática em curso.

O uso do judiciário e da mídia, o deslocamento desmedido de questões políticas e policiais para o campo judicial e midiático pode revelar ausência de espírito democrático de quem age assim e, em tese, verdadeira litigância de má-fé e ausência de espírito republicano, pois conduz para uma armadilha de gosto autoritário que é a criminalização da Política. Um desserviço sem precedentes à Democracia e à nação.

Vejo todos esses ingredientes na indignação manifestada por alguns setores da mídia e da sociedade decorrentes das denúncias “sigilosas” do ex-diretor da PETROBRAS. Há uma enorme hipocrisia e desavergonhado movimento de blindagem dos grandes grupos empresariais. Por que? Bem, antes vamos deixar claro que numa democracia, o direito à indignação é um direito sagrado.
Indignação é um substantivo feminino que pode significar “sentimento de cólera ou de desprezo excitado por uma afronta, uma ação vergonhosa, uma injustiça frisante, etc.”, mas é triste constatar que apesar de atos e fatos como a delação de Paulo Roberto Costa, feita sob sigilo (?), dificilmente os subornadores serão punidos, pois até hoje nenhuma investigação envolvendo grandes grupos prosperou na Justiça.

O "mensalão", por exemplo, só foi adiante depois que o Procurador Geral da República inicial, Antonio Fernando de Souza, o sucessor Roberto Gurgel e o relator Joaquim Barbosa, de triste memória, deram um jeito de tirar o Opportunity de Daniel Dantas do angu, como bem lembrou Luiz Nassif.

Outro exemplo? A Operação Satiagraha parou assim que a Polícia Federal identificou da Camargo Corrêa e que envolvia o então chefe da Casa Civil do governo Alckmin Arnaldo Madeira (hoje coordenador da campanha de Aécio em São Paulo).

Nos dois casos, alegou-se escutas ilegais para anular investigações e blindar os mesmos grupos que reaparecem na denúncia do tal Paulo Roberto Costa. Ou seja, o interesse público ficou em segundo plano, como quer um imbecil texano chamado Ron Paul, apresentado pela VEJA como um democrata libertário. 

O próprio episódio do “buraco no Metrô paulistano” resultou em um acordo nebuloso entre o governo José Serra, o Ministério Público Estadual de São Paulo e as empresas, pelo qual as diretorias foram poupadas. A quem interessou esse acordo?

O PSDB tem de dar conta ainda do escândalo das propinas e superfaturamento do Metrô, outro exemplo de esquema de corrupção de quase vinte anos envolto em mistério e impunidade, protegido pela mídia e, em certa medida, pelo Ministério Público. Já as denúncias que envolvem o PT “dão mais ibope” e tem mais espaço na mídia tradicional e despertam mais indignação. Indignação induzida. É isso que chamo de indignação seletiva.

Por que será que nesses casos os grupos de mídia não manifestaram indignação? Por que o PSDB e seus atores são poupados?

Penso que denúncias em véspera de eleição, indignação e espetáculos midiáticos são armas políticas ou de chantagem, não instrumentos de melhoria institucional, na forma que são instrumentalizados.

Como Nassif escreveu “Não fosse o envolvimento direto de grandes grupos econômicos blindados na Justiça, o episódio Paulo Roberto Costa seria mais agudo que o mensalão", concordo com ele, mas o episódio será utilizado de qualquer forma para criminalização da política e a “mãe de todos os crimes” (o financiamento privado de campanha) continuará graças à atuação Ministro Gilmar Mendes.

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