“Na primeira
noite, eles se aproximam e roubam uma flor do nosso jardim: não dizemos nada.
Na segunda, já não se escondem.
Pisam as flores, matam o nosso cão e não dizemos nada.
Até que um dia o mais frágil deles
entra sozinho em nossa casa, rouba-nos a luz e, conhecendo o nosso medo,
arranca-nos a voz da garganta.
E já não podemos dizer nada.”
(Bertolt Brecht)
Em comunicado, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP)
decidiu dispensar os operadores do direito do uso obrigatório de terno e
gravata, nos fóruns e prédios do TJ SP. A medida, recebida com alegria pela
advocacia, teria sido adotada em razão das altas temperaturas registradas neste
início de ano.
O desembargador José Renato Nalini, Presidente do TJ SP,
determinou que o uso do costume completo será facultativo até o dia 21 de
março. A liberação do terno e gravata não abrange a participação em audiências
no 1º grau de jurisdição e o exercício profissional na 2ª instância. A medida
foi corroborada pelo presidente da OAB SP.
Evidentemente todas as iniciativas que visem o bem estar e a saúde
dos advogados e demais operadores do direito são bem-vindas, entretanto e
apesar de enorme admiração que tenho pelo Dr. Renato Nalini acredito que o
Tribunal de Justiça não tem competência estabelecer critérios para o traje dos
advogados e caberia à OAB SP observar isso.
Aliás, penso que a decisão contida no tal “comunicado”, apesar de
meritória a primeira vista, representa uma visão equivocada acerca do papel que
o Poder Judiciário e a sociedade em geral tem acerca do advogado e da advocacia.
A advocacia não tem nenhuma subordinação ao Poder Judiciário e aos seus órgãos,
pois segundo o artigo 6º da Lei Federal 8.906/94
“Não há hierarquia nem subordinação entre
advogados, magistrados e membros do Ministério Público, devendo todos tratar-se
com consideração e respeito recíprocos.”, se não há hierarquia e
subordinação qual o sentido desse comunicado?
Em tempos de necessária harmonização institucional o correto seria
que o “comunicado” fosse assinado
conjuntamente pelo Presidente do Tribunal de Justiça, pelo Presidente da OAB SP
e pelo Ministério Público.
Por quê? Por que essa mesma lei federal que trata disso
objetivamente, lei que se aplica a todos. Ela estabelece que compete ao
Conselho Seccional da OAB determinar, com exclusividade, critérios para o traje
dos advogados.
Está lá, com todas as letras no artigo 58 que: “Compete
privativamente ao Conselho: XI – determinar, com exclusividade, critérios para
o traje dos advogados, no exercício profissional.”.
Há
quem pense como eu. O juiz da 1ª Vara
de Órfãos e Sucessões da cidade do Rio de Janeiro, João Batista Damasceno é um
deles. Ele chegou a afirmar que os tribunais não têm competência para
determinar o tipo de roupa que os advogados devem usar. Segundo ele cabe apenas
à OAB dispor sobre a indumentária dos advogados, pois quem fiscaliza o
exercício da advocacia é o órgão próprio da advocacia que é a OAB.
Diante da
existência de lei federal que dispõe clara e objetivamente de quem é a
competência para fiscalizar e disciplinar o exercício da advocacia, bem como determinar, com exclusividade, critérios para
o traje dos advogados, no exercício profissional me parece que está a OAB SP
renunciando indevidamente de sua competência e submetendo-se desnecessariamente
a decisões que não competem ao Poder Judiciário, o nosso silencio pode nos
conduzir ao momento em que já não poderemos dizer nada.
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