Todos sabem que a Fazenda do Estado de São Paulo (FESP), aplica
juros de mora diários que excedem, e muito, o índice da taxa anual utilizado
pela União, a denominada Selic. A Selic, é bom não esquecer, é utilizada como
referência pela política monetária que baseia as taxas de juros cobradas no
Brasil.
Esse excesso da Fazenda do Estado de São Paulo que penaliza o
contribuinte de maneira excessiva parece estar com os dias contados, pois em
recente julgado, o Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, decidiu,
nos autos de Argüição de Inconstitucionalidade nº 0170909-61.2012.8.26.0000, que a Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo não
poderá cobrar dos contribuintes com débitos de ICMS juros de mora diários
superiores à taxa Selic, devido à incompetência dos Estados para legislar em
matérias de competência concorrente com a União.
O voto condutor proferido na Apelação Cível nº
0002567-59.2011.8.26.0053 deixou assentado que: “A incompetência dos Estados para legislar sobre a matéria decorre do
que vem expresso no inciso VI, do artigo 22 da Constituição Federal, que
estabelece as competências privativas da União. O artigo 24 da Lei Maior, por
sua vez, ao estabelecer a competência concorrente entre União, Estado e
Distrito Federal, deixa claro que a competência da União é direcionada às
normas gerais, ficando para os Estados e o Distrito Federal as específicas, que
tratem de detalhes. Uma vez editada norma geral pela União, como ocorre na
hipótese em exame, as normas estaduais devem se limitar às particularidades,
adaptando às particularidades regionais, o
que não se mostra compatível com a significativa elevação dos juros incidentes
sobre o valor do imposto e/ou da multa.” [1]
(Grifo nosso)
No mesmo sentido e noutro caso, o voto do então Excelentíssimo
Ministro Nelson Jobim registra que: “Existindo
norma da União adotando índice de correção de débitos fiscais federais,
funciona ela, em relação aos Estados, como norma geral. Ou seja, o índice adotado pela União se constitui no parâmetro máximo
de correção para os Estados. Os Estados poderão escolher índices diversos
do adotado pela União. Tais índices não
poderão ultrapassar o da União, posto que os Estados, no tema, têm somente
competência legislativa suplementar.” [2]
E o louvável Ministro Sydney Sanches anotou a seu
tempo que: “Entendo que se trata de
direito financeiro, e o Estado pode legislar a respeito, só não pode exceder os
parâmetros federais” [3]
Ainda, o abalizado Ministro Néri da Silveira, entende
que: “A matéria é de direito financeiro e
não de direito monetário; os Estados podem estabelecer índices de atualização
de seus débitos, mas por se tratar
de matéria em que estamos num campo de
competência concorrente União e Estados, estes não poderão estabelecer índices
superiores aos estabelecidos pela União para a correção de seis débitos fiscais”
[4]
(grifo nosso)
A União e Estados detêm competência legislativa
concorrente para dispor sobre matéria financeira, nos termos do artigo 24,
inciso I, da Constituição Federal Brasileira de 1988, e, embora esses Estados
sejam incompetentes para fixar índices de correção monetária superiores aos
fixados pela União para o mesmo fim, podem defini-los em patamares inferiores.
Outrossim, a legislação paulista é compatível com a
Constituição Federal, desde que o fator de correção adotado pelo Estado seja
igual ou inferior ao utilizado pela União.
Conclui-se, portanto, que, os Estados podem
estabelecer os encargos incidentes sobre seus créditos fiscais, mas por se tratar de um campo de
competência concorrente, não poderão eles estabelecer índices e taxas
superiores aos estabelecidos pela União na cobrança de seus créditos, ou
seja, os Estados ao legislarem, não podem ultrapassar os limites fixados pela
União.
Atualmente por mero ato administrativo da Secretaria
da Fazenda do Estado de São Paulo define que os juros de mora estão fixados em
3,9 % ao mês, podendo chegar, portanto, a 46,8% ao ano, verdadeira natureza
confiscatória e distante do percentual da SELIC. Por isso nesse cenário, o
citado julgamento de Argüição de Inconstitucionalidade firmou o posicionamento
de que a taxa de juros incidente sobre os débitos de ICMS nos termos em que
instituí a Lei Estadual 13.918/09 é válida, mas limitada à taxa Selic,
utilizada pela União para atualização dos tributos federais.
É certo, portanto, que a taxa paulista extrapola a
razão de ser dos juros de mora, que por sua vez, atuam sempre como uma
indenização pela falta do pagamento no prazo e não como caráter punitivo. Nesse
sentido: “Considerando-se a natureza puramente indenizatória dos juros de mora,
a existência de multas de mora com o intuito de punir a mesma falta, e o curso
de captação médio de dinheiro pelo Estado, a violação aos princípios da
razoabilidade, da proporcionalidade e do não confisco mostra-se clara.” [5]
Observando que a taxa SELIC atualmente estar num patamar
entre 7,25% e 8,5% ao ano, torna-se
totalmente desproporcional uma taxa de juros de mora diária de 0,13% ao dia,
3,9% ao mês e 46,8% ao ano no Estado de São Paulo, conforme ordenado pela FESP.
Além disso, o Estado não pode legislar abusivamente, afinal a atividade
legislativa está subordinada a cumprimento de diretriz fundamental, que
encontra suporte no princípio da proporcionalidade e razoabilidade do poder
público. Vale aqui, destacar as palavras do Relator Paulo Dimas Mascaretti
quanto ao princípio da proporcionalidade: “O
princípio da proporcionalidade, nesse contexto, acha-se vocacionado a inibir e
a neutralizar os abusos do Poder Público no exercício de suas funções,
qualificando-se como parâmetro de aferição da própria constitucionalidade
material dos atos estatais.” [6]
Essa
proporcionalidade deve ser medida segundo padrões comuns na sociedade em que
vivemos, conforme regras expressas que
norteiam as relações constitucionais, e que são regidas pelo Poder Público.
Desta maneira, ambos os fundamentos podem ser considerados
desdobramentos da própria garantia constitucional da SEGURANÇA JURÍDICA, tratando-se de um dos valores mais
importantes em nosso ordenamento jurídico – eis a razão de sua inclusão tanto
no preâmbulo da Carta Magna, como no caput do artigo 5º, que trata das
garantias e dos direitos fundamentais.
Nesse diapasão, cumpre destacar que a discricionariedade é a competência-dever de o administrador, no caso
concreto, após a interpretação, valorar, dentro
de um critério de razoabilidade, e afastando de seus próprios standards ou ideologias,
portanto, dentro do critério de razoabilidade geral, qual a melhor maneira de
concretizar a utilidade pública postulada pela norma.
Neste escopo, há que se expor a disposição da jurisprudência
favorável neste sentido: “EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL - ICMS -
Cerceamento de defesa Inocorrência - A locação de conversores e "cable modens" é
inerente ao exercício da atividade-fim da apelante, razão pela qual incide o
ICMS Utilização da taxa SELIC para atualização do débito fiscal - Admissibilidade
Precedentes - Constitucionalidade da Lei Estadual 10.175/98, que prevê a
incidência da referida taxa - Reconhecimento da inconstitucionalidade da
interpretação dada pelo Fisco Estadual à Lei 13.918/09, sem alteração
gramatical - Aplicação de taxa de juros sobre o imposto ou a multa não
excedente a Selic. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS Fixação em 15% sobre o valor dado
aos embargos Ocorrência de exasperação imotivada Redução para 10% do valor do
débito atualizado Inteligência do art. 20 do CPC R. sentença reformada neste
ponto. Recurso parcialmente provido.” [7] [8]
Por fim, importante evidenciar a ementa parcialmente
procedente da Argüição de inconstitucionalidade, que, diga-se de passagem, nota
mais importante em destaque para a discussão: “INCIDENTE
DE INCONSTITUCIONALIDADE - Arts. 85 da Lei Estadual n° 6.374/89, com a redação
dada pela Lei Estadual n° 13.918/09 -
Nova sistemática de composição dos juros da mora para os tributos e multas
estaduais (englobando a correção monetária) que estabeleceu taxa de 0,13% ao
dia, podendo ser reduzida por ato do Secretário da Fazenda, resguardado o
patamar mínimo da taxa SELIC - Juros moratórios e correção monetária dos
créditos fiscais que são desenganadamente, institutos de Direito Financeiro
e/ou de Direito Tributário - Ambos os ramos do Direito que estão previstos em
conjunto no art. 24, inciso I, da CF, em que se situa a competência concorrente
da União, dos Estados e do DF - §§ 1o. a 4° do referido preceito constitucional
que trazem a disciplina normativa de correlação entre normas gerais e
suplementares, pelos quais a União produz normas gerais sobre Direito
Financeiro e Tributário, enquanto aos Estados e ao Distrito Federal compete
suplementar, no âmbito do interesse local, aquelas normas - STF que, nessa
linha, em oportunidades anteriores, firmou o entendimento de que os
Estados-membros não podem fixar índices de correção monetária superiores aos
fixados pela União para o mesmo fim (v. RE n" 183.907- 4/SP e ADI n° 442)
- CTN que, ao estabelecer normas gerais de Direito Tributário, com repercussão
nas finanças públicas, impõe o cômputo de juros de mora ao crédito não
integralmente pago no vencimento, anotando a incidência da taxa de 1% ao mês,
"se a lei não dispuser de modo diverso" Argüição de
Inconstitucionalidade n° 0170909-61.2012.8.26.0000 //, ' J PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO - Lei voltada à regulamentação de
modo diverso da taxa de juros no âmbito dos tributos federais que, destarte,
também se insere no plano das normas gerais de Direito Tributário/Financeiro,
balizando, no particular, a atuação legislativa dos Estados e do DF - Padrão da
taxa SELIC que veio a ser adotado para a recomposição dos créditos tributários
da União a partir da edição da Lei n° 9.250/95, não podendo então ser
extrapolado pelo legislador estadual - Taxa SELIC que, por sinal, já se presta
a impedir que o contribuinte inadimplente possa ser beneficiado com vantagens
na aplicação dos valores retidos em seu poder no mercado financeiro, bem como
compensar o custo do dinheiro eventualmente captado pelo ente público para
cumprir suas funções - Fixação originária de 0,13% ao dia que, de outro lado,
contraria a razoabilidade e a proporcionalidade, a caracterizar abuso de natureza
confiscatória, não podendo o Poder Público em sede de tributação agir
imoderadamente - Possibilidade, contudo, de acolhimento parcial da argüição,
para conferir interpretação conforme a Constituição, em consonância com o
julgado precedente do Egrégio STF na ADI n° 442 - Legislação paulista
questionada que pode ser considerada compatível com a CF, desde que a taxa de
juros adotada (que na atualidade engloba a correção monetária), seja igual ou
inferior à utilizada pela União para o mesmo fim - Tem lugar, portanto, a
declaração de inconstitucionalidade da interpretação e aplicação que vêm sendo
dada pelo Estado às normas em causa, sem alterá-las gramaticalmente, de modo
que seu alcance valorativo fique adequado à Carta Magna (art. 24, inciso I e §
2o) - Procedência parcial da argüição.” [9]
Por isso devem os administradores observar a crescente importância do planejamento fiscal numa empresa
que, norteando suas atividades e negócios com habilidade e inteligência, de
maneira lícita, visa proporcionar-lhe uma satisfatória economia tributária
evitando, sempre que possível, os procedimentos mais onerosos do ponto de vista
fiscal e financeiro.
Destacando a licitude
e naturalidade do planejamento, preventivo ou não, oportunas as palavras de
Alfredo Augusto Becker quando ressalta o único limite objetivo paro o
contribuinte, qual seja o de violar alguma regra jurídica seria a aspiração
naturalíssima e intimamente ligada à vida econômica, a de procurar determinado
resultado econômico com maior economia, isto é, com a menor despesa (os
tributos que incidirão sobre os atos e fatos necessários à obtenção daquele
resultado econômico são parcelas que integrarão a despesa).
Ora, todo o indivíduo,
desde que não viole regra jurídica, tem a indiscutível liberdade de ordenar
seus negócios de modo menos oneroso, inclusive tributariamente.
Nesse contexto, dentre as hipóteses de planejamento
fiscal, o qual nós entendemos ser espécie do gênero Planejamento Empresarial,
qualquer uma que eventualmente venha a ser eleita como a mais adequada ao
objetivo pretendido, poderá ser colocada em prática, tendo em vista a liberdade
que o contribuinte possui de planejar suas atividades segundo seus interesses,
observado os procedimentos legalmente previstos.
Klaus Tipke, que "o direito tributário elege como
fatos geradores determinados atos ou fatos econômicos e jurídicos que se deseja
que sejam praticados (ao contrário do Direito Penal), mas não obriga seja
adotada aquela forma jurídica, dentre as várias possibilidades admitidas pelo
ordenamento jurídico.".
Por isso os leitores podem ficar tranqüilos, pois o
que acabamos de afirmar encontra respaldo Jurisprudencial, ou seja, é possível
ao contribuinte, segundo antigo 1º Tribunal de Alçada de São Paulo e de acordo
com a Câmara Superior de Recursos Fiscais do Conselho de Contribuintes,
realizar determinada operação ou atividade econômica de forma planejada ou, em
outras palavras, esses tribunais, um judicial, outro administrativo, admitem a
elisão fiscal.
Vejamos: "Uma empresa pode ser organizada de
forma a evitar excessos de operações tributadas e, conseqüentemente, evitar a
ocorrência de fatos geradores por ela e perante a lei desnecessários, como
poderia funcionar por modalidades legais menos tributadas. Fica ao contribuinte
a faculdade de escolha ou planejamento fiscal.”, por isso atenção à questão dos
Juros moratórios abusivamente cobrados pela FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO.
[1]Apelação Cível nº 0002567-59.2011.8.26.0053 – São Paulo – 13ª
Câmara de Direito Público – Ministra Relatora Luciana Bresciani)
[2] (Arguição
de inconstitucionalidade nº 0170909-61.2012.8.26.0000, São Paulo, São Paulo – 13ª Câmara de
Direito Público – Relator Paulo Dimas Mascaretti).
[3] (Arguição
de inconstitucionalidade nº 0170909-61.2012.8.26.0000, São Paulo, São Paulo – 13ª Câmara de
Direito Público – Relator Paulo Dimas Mascaretti).
[4] (Arguição
de inconstitucionalidade nº 0170909-61.2012.8.26.0000, São Paulo, São Paulo – 13ª Câmara de
Direito Público – Relator Paulo Dimas Mascaretti).
[5] (STF, Pleno, ADI-MC-QO nº 2.551/MG, Relator Ministro Celso
de Mello, DJ 20.04.2006, p.05)
[6] (Arguição
de inconstitucionalidade n.0170909-61.2012.8.26.0000 – São Paulo, São Paulo – 13ª
Câmara de Direito Público – Relator Paulo Dimas Mascaretti).
[7] (Apelação
nº 0002149-60.2008.8.26.0269, Itapetininga, São
Paulo – 9ª Câmara de Direito Público – Relator Carlos Eduardo Pachi).
[8] EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL ICMS - Rejeição
pronunciada em primeiro grau - Auto de Infração e Imposição de Multa
lavrado por suposta ausência de recolhimento do tributo, na qualidade de
tomadora de serviço de transporte rodoviário de mercadorias, com esteio no art.
317 do RICMS (Dec. nº 45.490/00) Autuação fiscal que se deu a partir da análise
dos conhecimentos de transporte rodoviário de cargas (CTRC's), emitidos por
terceira empresa, que apontam a ora apelante como destinatária das mercadorias
e, portanto, tomadora dos serviços de transporte realizados Apelante que em
nenhum momento negou a ocorrência das operações de transporte aludidas Operações
que estavam submetidas ao instituto da substituição tributária, diferindo-se o
recolhimento do ICMS incidente para momento posterior, sob a responsabilidade
da adquirente, como se infere da redação do arts. 8º, inc. II, alínea
"b", da LCE nº 87/96, 28, da Lei Estadual nº 6.374/89, com a redação
dada pela Lei Estadual nº 9.794/97 e 317 do RICMS Exigência do recolhimento
pertinente que, destarte, deve subsistir Multa pelo descumprimento de suas
obrigações tributárias que, outrossim, possui caráter punitivo-tributário e
está prevista no art. 527, inc. I, alínea "l", c.c. §§ 1º e 10 do
RICMS/00 Imposição que, no entanto, corresponde a 150% do valor do tributo
devido, podendo então ser mitigada, pois não se coaduna com a razoabilidade à
qual se deveria ater o órgão autuante Pertinência, nas circunstâncias, da sua
redução a 50% sobre a base de cálculo, representada pelo imposto devido É de se
afastar, ainda, a aplicação da taxa de juros estabelecida no artigo 96 da Lei
nº 6.374/89, alterada pela Lei nº 13.918/09 Padrão da taxa SELIC que veio a ser
adotado para a recomposição dos créditos tributários da União a partir da
edição da Lei nº 9.250/95, não podendo então ser extrapolado pelo legislador
estadual Taxa SELIC que, por sinal, já se presta a impedir que o contribuinte
inadimplente possa ser beneficiado com vantagens na aplicação dos valores
retidos em seu poder no mercado financeiro, bem como compensar o custo do
dinheiro eventualmente captado pelo ente público para cumprir suas funções
Fixação originária de 0,13% ao dia que, na verdade, contraria a razoabilidade e
a proporcionalidade, a caracterizar abuso de natureza confiscatória, não
podendo o Poder Público em sede de tributação agir imoderadamente Apelo da
embargante provido em parte. (Apelação nº 0007017-56.2011.8.26.0405, Osasco, São Paulo –
8ª Câmara de Direito Público – Relator Paulo
Dimas Mascaretti).
[9] (Argüição
de inconstitucionalidade nº 0170909-61.2012.8.26.0000, São Paulo, São Paulo – 13ª Câmara de
Direito Público – Relator Paulo Dimas Mascaretti).
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