Num dado momento de sua vida o
cineasta Glauber Rocha, baiano de Vitória da Conquista, venceu um concurso e
obteve uma bolsa para estudar na Universidade de Sorbonne em Paris para
escrever uma tese sobre o cinema no 3º. Mundo.
Segundo ele próprio “por
falta de vocação acadêmica” nunca escreveu a tese, mas fez muitas reflexões.
Glauber, vencedor de três
Palmas de Ouro em Cannes, era um gênio inquieto e até hoje incompreendido que
numa dessas reflexões parisienses faz um questionamento que, na minha maneira
de ver, é meramente retórico, ele se pergunta (e nos pergunta): "Um pais subdesenvolvido economicamente pode
produzir um cinema esteticamente desenvolvido? Porque no terceiro mundo a
maioria dos artistas, intelectuais e pessoas que se ocupam de arte são
profundamente colonizadas. Ainda julgam a arte e a realidade a partir de uma
informação filosófica europeia e americana: mesmo as pessoas revolucionárias
são colonizadas mentalmente.".
Glauber na verdade propõe que
gritemos “independência ou morte” ao processo de colonização estética ao qual
estávamos e estamos submetidos até hoje. Não é incomum ouvirmos de pessoas “bem
formadas” referências elogiosas à Europa e aos Estados Unidos e criticas quase
sempre rasas, ao Brasil e à América Latina e como alertou Glauber “mesmo as pessoas revolucionárias são
colonizadas mentalmente" julgam a realidade a partir de outro
hemisfério... Temos de superar isso. Como? Reconhecendo valor no Brasil, em sua
História, suas cores, seu som, sua forma peculiar de transformar e
transformar-se, de superar e vencer desafios, de crescer e de nunca desistir.
A própria vida de Glauber é
exemplo disso. Glauber Rocha
realizou vários curtas-metragens,
ao mesmo tempo em que se dedicava ao cineclubismo e
fundava uma produtora cinematográfica, um lutador. Deus e o Diabo na
Terra do Sol (1964), Terra em Transe (1967) e O Dragão da Maldade
contra o Santo Guerreiro (1969) são três filmes paradigmáticos, nos quais
uma crítica social feroz se alia a uma forma de filmar que pretendia cortar
radicalmente com o estilo importado dos Estados Unidos.
Essa pretensão era compartilhada pelos outros cineastas do Cinema Novo,
corrente artística nacional liderada principalmente por Rocha e grandemente
influenciada pelo movimento francês Nouvelle Vague e pelo Neorrealismo italiano. Glauber Rocha foi um cineasta controvertido
e incompreendido no seu tempo, além de ter sido patrulhado tanto pela direita
como pela esquerda brasileira. Ele tinha uma visão apocalíptica de um mundo em
constante decadência e toda a sua obra denotava esse seu temor. Para o poeta Ferreira Gullar,
"Glauber se consumiu em seu próprio fogo". Com Barravento ele foi premiado no Festival Internacional de Cinema de Karlovy Vary na Tchecoslováquia em 1963.
Um ano depois, com “Deus e o diabo na terra
do sol”, ele conquistou o Grande Prêmio no Festival de Cinema Livre da Itália e
o Prêmio da Crítica no Festival Internacional de Cinema de Acapulco.
Mas foi com “Terra
em Transe” que tornou-se
reconhecido, conquistando o Prêmio da Crítica do Festival de Cannes, o Prêmio Luis Buñuel na Espanha,
o Prêmio de Melhor Filme do Locarno
International Film Festival, e o Golfinho de Ouro de melhor filme do ano no Rio de Janeiro.
Outro filme premiado de Glauber foi “O Dragão da Maldade contra o Santo
Guerreiro”, prêmio de melhor direção no Festival de Cannes e, outra vez, o
Prêmio Luiz Buñuel na Espanha.
Glauber venceu criando uma estética e uma
linguagem que negava a estética do cinema dos colonizadores. O mundo já reconhece esse nosso valor, falta uma
parcela de brasileiros reconhecerem.
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