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EFEITO RASHOMON E GURGEL


O Procurador-Geral, o Senhor Gurgel, apresentou denuncia criminal em face do ex-ministro Zé Dirceu, processo 470 que tramita no STF, a denuncia não contém provas. 
Isso mesmo, nenhuma testemunha ouvida durante as investigações declarou objetivamente que ele é autor dos atos criminosos que o procurador a ele imputa, não há sequer um documento indique que Zé Dirceu seja de fato membro ou chefe de quadrilha ou que tenha orientado ou praticado qualquer ato de corrupção, ou seja, o procurador busca a condenação do ex-ministro mesmo sem provas. O faz reconstruindo, a partir de versões e impressões de forte caráter ideológico e a serviço de quem apenas ele e sua consciência sabem. Assisti outro dia ao filme e penso ser possível um paralelo entre a alegoria de Kurosawa e a atuação do nosso por enquanto Procurador-Geral.
Rashomon é um filme japonês de 1950 escrito e dirigido por Akira Kurosawa, vencedor do Oscar e do Leão de Ouro, além de haver recebido diversas indicações em outros festivais, é baseado em dois contos de Ryūnosuke Akutagawa (Rashomon, que fornece a ambientação e Yabu no Naka, que determina os personagens e a trama). O sugere a impossibilidade de obter a verdade sobre um evento quando há conflitos de pontos de vista distintos e até mesmo ideológicos.
Bem, o filme descreve eventos que são tratados como estupro e assassinato através dos relatos amplamente divergentes de quatro testemunhas, incluindo o próprio criminoso e, através de um médium, e da própria vítima.
A história se desvela em flashbacks conforme os quatro personagens — o próprio bandido, o samurai assassinado, sua esposa e o lenhador sem nome — recontam os eventos de uma tarde em um bosque. Mas é também um flashback dentro de um flashback, porque os relatos das testemunhas são recontados por um lenhador e um sacerdote para um grosseiro plebeu enquanto eles esperam por uma tempestade em uma portaria arruinada. Cada história é mutuamente contraditória, deixando o espectador incapaz de determinar a verdade sobre os eventos.
No filme não há uma solução para o suposto crime, até porque o objetivo de Kurosawa deve ter sido a reflexão sobre a possibilidade/impossibilidade de se apurar a verdade a partir de relatos contraditórios. Se não há provas o que temer?
A partir do filme a palavra "Rashomon" passou a ser referência para qualquer situação na qual a veracidade de um evento é difícil de ser verificada devido a julgamentos conflitantes de diferentes testemunhas. Na psicologia, o filme emprestou seu nome ao chamado "Efeito Rashomon", que estaria relacionado ao caráter reconstrutivo da memória, o termo é freqüentemente usado por psicólogos em situações em que os observadores dão contas diferentes do mesmo evento, e descreve o efeito das percepções subjetivas sobre recolhimento. A idéia de quenão me lembro de coisas como elas realmente acontecem” é geralmente atribuída a Sir Frederick Bartlett (1886-1969). De acordo com Bartlett, as memórias são organizados dentro dos quadros históricos e culturais (que Bartlett chamado 'esquemas') do indivíduo, e o processo de recordar envolve a recuperação de informação que tenha sido inadvertidamente alterados, a fim de que ele seja compatível com pré-existente conhecimento.
O Nosso procurador precisa ser internado ou agraciado com um Nobel de Psicologia, pois ele foi além do “efeito Rashomon”, pois ele não reconstruiu memórias e testemunhos ele os criou, afinal ausentes os fatos e ações que pudessem levar à condenação de Zé Dirceu o Procurador. 
É verdade que Heráclito afirmou que “Ser Homem é interpretar”... Contudo Heráclito não disse para criarmos realidade, fatos e atos, não disse para mentirmos.

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