“Em todo ordenamento o ponto de referência último de todas as normas é o poder originário, ou seja, o poder além do qual não existe outro em que se possa fundar o ordenamento jurídico”
(BOBBIO, Teoria Geral do Direito, 2010, p. 204-205).
Os fascistas de plantão querem acabar com o Estado de Direito, com o Devido Processo Legal, e com vários direitos civis e humanos que foram reconquistadas pelos verdadeiros brasileiros, o povo. Basta uma simples denuncia, uma investigação ou um processo sem provas tramitando no nosso judiciário ou nos escaninhos quase secretos do ministério público para macular vidas e histórias, para serem criados dramas individuais cujo dano, em não se comprovando a denuncia, é irreparável.
Será que só eu estou vendo isso? Estarei em estado de ilusão?
Não sei... Mas acredito que nenhuma lei não pode acabar com garantias civis e humanas garantidas constitucionalmente.
Contudo, o que vemos todos os dias é uma campanha midiática sem precedentes tentando fazer crer a todos que há direitos demais, que o exercício da Política é para bandidos e que a instalação de um verdadeiro Estado de Policia é necessária.
Mas o que é o tal Estado de Policia? Uma das conceituações para Estado de Polícia é a situação antagônica ao Estado de Direito. Contudo, é imprescindível realçar que não é da “Polícia”, como instituição criada dentro dos Estados para garantir direitos, que a que me refiro.
Estou evidentemente falando de circunstâncias, que a humanidade já viveu em que os direitos individuais, as garantias constitucionais e os direitos humanos eram sonhos e estavam distantes.
Esse tal Estado de Policia, defendido de forma subliminar pelos arautos da neo-UDN, é um risco. E o que é pior, irrefletidamente, alguns setores da sociedade tidos como republicanos, democráticos e progressistas estão se deixando seduzir pela cantinela fascista que pode nos levar à (i) desconstrução da estrutura formal do sistema jurídico, das garantias das liberdades fundamentais com aplicação da lei geral-abstrata por parte de juízes independentes, (ii) à desestruturação material do sistema jurídico, indutora de um Estado mínimo que nada regula e que lança ao caos nações e vidas, (iii) à desestruturação social do sistema jurídico, colocando a questão social como tema de segunda categoria e também (iv) à desestruturação política do sistema jurídico, que compromete a separação e distribuição do poder e hipertrofia inicialmente o Poder Judiciário deslocando para lá questões estranhas à dinâmica do Judiciário e que devem ser superadas na arena onde o protagonista é o cidadão, que diretamente ou democraticamente representado poderá opinar, escolher, etc., ou seja, na arena política, na sociedade.
Exemplo disso está nas campanhas artificiais e hipócritas de combate à corrupção. É evidente que o político, o agente público e o empresário corruptos e corruptores têm de ser investigados, processados e condenados em se comprovando a prática do ilícito, mas limitar o combate à corrupção aos seus efeitos mais visíveis é equivoco, pois impede a reflexão sobre as causas, sobre a origem desse fenômeno que está mais visível em razão da midiatização necessária de fatos que causam indignação a todos nós e da independência das policias e do ministério público, mas a sociedade não pode perder de vista os princípios constitucionais.
Ainda sobre o tema corrupção é possível afirmar que tem ela deve ser encarada e enfrentada como um fenômeno que ocorre num mundo de economia de mercado e não pode ser entendida como se fosse apenas de “desvio de condutas individuais”, como bem nos alerta o Dr. Jose Henrique Rodrigues Torres, Juiz de Direito e Presidente de entidade nacional que defende a democracia e os direitos humanos numa bela entrevista recentemente.
E por essa lógica bastaria ao combate da corrupção uma atuação policial mais firme, ou seja, limitada ao âmbito do Direito Penal.
Contudo sabe-se que isso não basta. Esse é um discurso equivocado e conservador. É o discurso “sedutor”, mas é limitante, pois reduz a compreensão do fenômeno ao moralismo burguês e busca soluções dentro do próprio sistema que é em si a causa da corrupção.
O Dr. Torres afirma que essa forma de ver o problema preserva o sistema “e, especialmente, sob a ótica neoliberal” e é indutor de uma lógica que busca transferir o seu controle do Estado à iniciativa privada.
Quando limitamos a compreensão do fenômeno em comento aos desvios de conduta de pessoas a conclusão lógica é que são os corruptos e os corruptores seres, “mas o sistema é bom e deve ser preservado”, será que isso é verdade? Não, não é verdade.
A corrupção não é um fenômeno intrínseco ao serviço público, o agente público não é corrupto por natureza, e não cabe aos setores privados assumir o controle do Estado.
E para que não digam que estou a defender a corrupção ou os corruptores lanço uma idéia: se um deputado, vereador, senador, prefeito, governador, presidente, ou mesmo um simples agente público nomeado por indicação ou com aval de um partido político, for condenado (após o devido processo legal) por atos de improbidade que o enriquecem ilicitamente ou causam prejuízo ao erário público, seria co-responsabilizar os dirigentes partidários pessoalmente e os partidos.
Por quê? Porque a indicação e a concessão de legenda a pessoa useira e vezeira de praticas reprováveis é responsabilidade da agremiação e dessa co-responsabilidade poder-se-ia fazer com que o partido e o dirigente sejam co-réus e co-obrigados na reparação do dano, com bloqueio de patrimônio e restrições na participação no fundo partidário, talvez assim tivéssemos mais cuidado de todos.
Mas tudo deve ser legitimado no espaço adequado: a sociedade. Por quê? Por que o Estado Democrático de Direito, dentre outras questões passiveis de serem levantadas, acrescenta aos conceitos referentes à própria formulação do Estado Moderno um novo espaço, um espaço necessário para interpretações construtivistas. Trata-se de discutir o papel da Constituição e do próprio Poder Judiciário, como última instância de interpretação desse documento essencial para a caracterização de um “Estado de Direito” e não a primeira ou a mais importante.
Podemos citar Habermas sobre o Estado Democrático de Direito e lembrar que para ele o Estado Democrático de Direito deve buscar permanente de legitimação, o que só ocorre na sociedade e não nas estruturas meritocráticas do Poder Judiciário. Porque o Direito exige aceitação social e reconhecimento e a legitimidade é a tônica do Estado Democrático de Direito.
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