Discute-se a possibilidade, ou não, das sociedades
limitadas emitirem debêntures. Já a pedidos na Junta Comercial de São Paulo
(Jucesp) para inscrição das escrituras de debêntures por uma sociedade
limitada, e Renzo Brandão
Gotlib[1] noticia que a Junta Comercial do Rio de Janeiro (Jucerja) decidiu sobre
o arquivamento de ata de assembléia de sócios que deliberava a emissão de
debêntures.
Em ambos os casos, os órgãos se negaram ao
arquivamento, baseando-se no fato de que a emissão do título é possível apenas
por sociedades anônimas. Penso que é possível às sociedades limitadas emitirem
debêntures, pois a Instrução nº 476, editada pela Comissão de Valores
Mobiliários (CVM), instrução que regula as ofertas públicas não limita sua
abrangência a nenhum tipo societário.
As sociedades limitadas deveriam começar por uma avaliação de seu
negócio. Seria um bom primeiro passo para implantação das boas práticas e da
governança corporativa, pois como ensina o
professor Fernando Nogueira da Costa, Professor
Livre-docente do IE-UNICAMP: “O crescimento econômico, tal
qual o conhecemos, vem se fundando na preservação dos privilégios das elites
que satisfazem seu afã de modernização; já o desenvolvimento [econômico e social] se caracteriza
pelo seu projeto social subjacente. Dispor de recursos para investir está longe
de ser condição suficiente para preparar um melhor futuro para a massa da
população. Mas quando o projeto social prioriza a efetiva melhoria das
condições de vida dessa população, o crescimento se metamorfoseia em
desenvolvimento.” Penso que
reconhecer o direito de outros tipos societários à emissão de debêntures e
ingresso no mercado de capitais é um avanço pelo qual devemos lutar.
As opiniões
divergentes não se sustentam, pois o Direito é formado por um conjunto coerente
de normas, representando uma unidade, um ordenamento guiado, acima de tudo, por
princípios jurídicos. O Direito não é mera concatenação de fórmulas verbais
articuladas entre si, pois os princípios não se colocam, pois, além ou acima do
Direito ou do próprio Direito positivo, numa visão “pós-positivista”, os
princípios encontram-se entrelaçados ao ordenamento, não como fonte normativa
subsidiária – como defendem os positivistas –, mas como direito com autoridade
para fazer imperar uma obrigação legal.
E nesse
sentido se uma empresa pode ser organizada de forma e evitar excessos de
operações tributadas e, conseqüentemente, evitar a ocorrência de fatos geradores
para ela e perante lei desnecessários pode e deve na gestão da sociedade como o
próprio legislador impôs ao administrador, empregar todos os recursos -
obviamente legais - que estiverem a seu alcance, no sentido de lograr os fins e
no interesse da empresa. Exemplo disso é a Lei das Sociedades por Ações, que
nos seus artigos 153 e 154, é imperativa e diz que o administrador da companhia
deve empregar, no exercício de suas funções, o cuidado e diligência que todo
homem ativo e probo costuma empregar na administração dos seus próprios
negócios, bem como deve exercer as atribuições que a lei e o estatuto lhe
conferem para lograr os fins e no interesse da sociedade, satisfeitas as
exigências do bem público e a função social da empresa.
Excluir as
sociedades limitadas da possibilidade de captar junto a mercado recursos para
seu adequado desenvolvimento e perenidade é negar o próprio mercado e
estabelecer a existência de sociedades de “segunda” categoria, bem como ignorar
que com a criação da Instrução nº 476 a intenção da CVM é facilitar o acesso ao
mercado de capitais.
A simples ausência de previsão legal expressa
não inviabiliza a emissão de debêntures pelas sociedades limitadas,
especialmente se lembrarmos que tudo aquilo que não é proibido é permitido (TJSC,
Apelação Cível n. 00.020874-4, de Dionísio Cerqueira, rel. Des. Sérgio Roberto
Baasch Luz, DJe de 22-4-2004).
A CVM
respondeu ao questionamento afirmando que não havia se convencido da
necessidade de restringir a possibilidade de realizar ofertas públicas com
esforços restritos a um ou mais tipos societários. Diante da resposta da CVM,
não que se falar em vedação a nenhum tipo societário a emissão dos títulos
abrangidos pela Instrução nº 476. E a CVM é
uma entidade autárquica em regime especial, subordinada ao Ministério da
Fazenda, mas sem subordinação hierárquica. A CVM tem poderes para disciplinar,
normatizar e fiscalizar a atuação dos diversos integrantes do mercado. Seu
poder normatizador abrange todas as matérias referentes ao mercado de valores
mobiliários.
No Brasil a
maioria das sociedades é constituída sob a forma de sociedade limitada e,
muitas delas, além de serem tão desenvolvidas quanto às sociedades por ações,
possuem estrutura e capital suficiente para efetuar a emissão de debêntures. Além
disso, esta seria uma forma menos burocrática e onerosa que tomar um empréstimo
bancário para captar recursos, tendo em vista a flexibilidade do título, no
qual se podem estipular as condições de sua emissão. Essas condições estarão
sempre relacionadas às boas práticas e à governança corporativa. A CVM possui
uma cartilha que trata das boas práticas e da governança corporativa. Penso que
as sociedades limitadas devem seguir as orientações e adaptá-las à sua espécie
societária e passar a cuidar da transparência, da estrutura e responsabilidade
do conselho de administração, da proteção a cotistas minoritários e da
implantação de auditorias e demonstrações financeiras.
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