Pular para o conteúdo principal

Sobre a injusta escolha de Sarney como o bode expiatório.


O Senado está em maus lençois (expressão que no site www.dicinárioinformal.com.br significa “Situação de dificuldade, passada por uma pessoa, em conseqüência de fatos ou ações que tenha praticado” e, em razão dos atos praticados pelo próprio Senado, de responsabilidade de cada um dos senadores, sem exceção, está em busca de um bode expiatório.
Parece que o bode escolhido pelo Senado (entendo-se por “senado” os senadores seus burocratas e toda a cultura patrimonialista que eles representam) é o Presidente José Sarney. Afastar Sarney é menosprezar a inteligência da sociedade. Será ele o único culpado pela farra reinante no Senado? Evidentemente que não.
Nunca é demais lembrar que patrimonialismo é a característica de um
Estado que não possui distinções entre os limites do público e os limites do privado, e que foi comum em praticamente todos os absolutismos e mantêm-se em sociedades de atrasadas e sem clara noção do que é interesse público.
Como o termo sugere, o Estado acaba se tornando um patrimônio de seu governante, porque no passado o monarca gastava as rendas pessoais e as rendas obtidas pelo governo de forma indistinta, ora para assuntos que interessassem apenas à seu uso pessoal (compra de roupas, por exemplo), ora para assuntos de governo (como a construção de uma estrada).
A quem afirme que essa prática se instaurou na Europa através dos
germanos que invadiram Roma. Os romanos tinham por característica a república, forma onde os interesses pessoais ficavam subjugados aos da república, já os bárbaros vindos da Germânia, que aos poucos foram dando forma ao Império decadente, tinham o patrimonialismo como característica, onde o reino e suas riquezas eram transmitidas hereditariamente, de forma que os sucessores usufruiam dos benefícios do cargo, sem pudor em gastar o tesouro do reino em benefício próprio ou de uma minoria, sem prévia autorização de um senado.
É mais ou menos o que ocorre no Senado, falta de pudor, por isso vale a pena falar um pouco sobre o significado da expressão “bode expiatório”. Bem, em sentido figurado, um "bode expiatório" é alguém que é escolhido arbitrariamente para levar (sozinho) a culpa de uma calamidade, crime ou qualquer evento negativo (que geralmente não tenha cometido).
A busca do bode expiatório é um ato irracional de determinar que uma pessoa ou um grupo de pessoas, ou até mesmo algo, seja responsável de um ou mais problemas. É uma busca covarde, mesquinha e mediocre.
Eleger o Presidente José Sarney como bode expiatório é um importante instrumento de propaganda, e um clássico exemplo são os judeus durante o período nazista na Alemanha, que eram apontados como culpados pelo colapso politico e pelos problemas econômicos daquele pais, dentre outras “culpas” que a propaganda oficial lhe impunha.
Quando Senadores, homens que representam seus estados e um dos Poderes da República buscam transferir a uma pessoa apenas as responsabilidades que é de todos, inclusive da sociedade, estão equiparando-se e validando práticas nazistas.
Ao longo da História os grupos usados como bode expiatórios foram muitos, variando de acordo com o local e o período. Os negros, os imigrantes, os comunistas, os capitalistas, os "nordestinos no Brasil", as "bruxas", as mulheres, os pobres, os judeus, os leprosos, os homossexuais, os deficientes físicos e/ou mentais, os ciganos, etc, de acordo com a conveniência e oportunidade, mas hoje é intolerável o uso de bodes expiatórios, o que o Senado deve fazer é auditar com independência e dar publicidade à auditoria realizada, para que a sociedade, através da imprensa responsável, possa conhecer e expressar-se e julgar livremente.
O Senado deve enviar ao Ministério Público Federal o resultado da auditoria para que todos aqueles que praticam ou praticaram atos ilegais, imorais, secretos e ineficientes, ou seja, todos que descumpriram o artigo 37 da CF devem responder por isso.
É verdade que na teologia cristã, a história do bode expiatório no Levítico é interpretado como uma prefiguração simbólica do auto-sacrifício de Jesus, que chama a si os pecados da Humanidade, tendo sido expulso da cidade sob ordem dos sacerdotes, mas Sarney não é Jesus e o Senado não é a humanidade.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

SOBRE PERIGOSO ESTADO MINIMO

O governo Temer trouxe de volta a pauta neoliberal, propostas e ideias derrotadas nas urnas em 2002, 2006, 2010 e 2014. Esse é o fato. Com a reintrodução da agenda neoliberal a crença cega no tal Estado Mínimo voltou a ser professada, sem qualquer constrangimento e com apoio ostensivo da mídia corporativa. Penso que a volta das certezas que envolvem Estado mínimo, num país que ao longo da História não levou aos cidadãos o mínimo de Estado, é apenas um dos retrocessos do projeto neoliberal e anti-desenvolvimentista de Temer, pois não há nada mais velho e antissocial do que o enganoso “culto da austeridade”, remédio clássico seguido no Brasil dos anos de 1990 e aplicado na Europa desde 2008 com resultados catastróficos. Para fundamentar a reflexão e a critica é necessário recuperarmos os fundamentos e princípios constitucionais que regem a Ordem Econômica, especialmente para acalmar o embate beligerante desnecessário, mas sempre presente. A qual embate me refiro? Me ref...

DA FAMÍLIA CORLEONE À LAVA-JATO

A autolavaggio familiare agiu e reagiu, impondo constrangimento injusto ao atacar a reputação de advogados honrados. Me refiro a Roberto Teixeira e Cristiano Zanin. Já perguntei aqui no 247 [1] : “ Serão os jovens promotores e juízes "de baixa patente" os novos tenentes" Penso que sim, pois assim como os rebeldes do inicio do século XX, os jovens promotores e juízes, passaram a fazer política e interferir nas instituições e estruturas do Estado a seu modo. Mas em alguns momentos as ações e reações deles lembram muito a obra de Mario Puzzo. As ideais dos rebeldes do início do século XX, assim como dos promotores e juízes desde inicio de século XXI, eram ao mesmo tempo conservadoras e autoritárias; os tenentes defendiam reformas políticas e sociais - necessárias naquele momento -, e no discurso estavam presentes os sempre sedutores temas do combate à corrupção e defesa da moralidade política. Deltan Dallagnol e Sérgio Moro representam os jovens promotores e juízes d...

PALOCCI, UM GRANDE FILHO DA PUTA.

Todos que jogam ou jogaram futebol, bem como aqueles apaixonados que frequentam as arquibancadas para torcer pelo seu time do coração ouvem e, por certo, já proferiram a libertadora expressão “ filho da puta ” ou, com mais esmero, “ filho de uma puta ”, dentre outros palavrões de caráter igualmente libertador. E todos sabem que tal expressão tem semântica própria, pois ninguém que refere à mãe daquele a quem direcionamos qualquer dos necessários palavrões. O adequado uso de palavrões representa síntese e expressa indignação diante de um erro inescusável do Juiz ou de um dos jogadores de qualquer dos times, há, portanto, uma dialética nos palavrões e isso merece atenção. Ou seja, é há uma dialética do palavrão. Na literatura também encontramos o uso de palavrões. Entre os escritores mais lidos da literatura brasileira, o romancista baiano Jorge Amado (1912-2001) é um dos que mais usa o palavrão em sua vasta obra literária. E falando em romances, Amado não é o único int...